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CARLOS HEITOR CONY
Santo subito
RIO DE JANEIRO - Querendo ou não, o assunto dos últimos dias continua
sendo a morte de João Paulo 2º. Durante o seu funeral, uma faixa chamou a atenção de todos: "Santo subito". Em tradução literal, santo já,
santo logo, santo imediatamente.
Todos sabemos, e o próprio João
Paulo 2º o disse várias vezes, que a
Igreja Católica não é uma instituição
democrática. É uma monarquia não-dinástica, o soberano é eleito por um
colegiado, como nos regimes parlamentaristas, mas os cardeais que o
compõem não são eleitos pelo povo. É
complicado explicar, mas é assim
mesmo.
A faixa estendida na praça de São
Pedro trazia um apelo fortemente
popular. E, no encerramento da cerimônia, quando o caixão do papa
saía das vistas do povo e entrava na
basílica, o grito partiu de toda aquela
multidão: "Santo! Santo! Santo!".
Uma canonização apressada mas
espontânea, sem cabos eleitorais,
inesperada. Expressava um sentimento geral. Sabemos como é complexo o processo de canonização, são
necessários mil requisitos, testemunhos, milagres, há até mesmo a figura do advogado do diabo, criação estupenda da tradição católica, um
promotor com dezenas de auxiliares
que esmiúçam a vida e as obras do
candidato a santo, procurando pecados, falhas e omissões.
Em se tratando de pessoa desconhecida, a tarefa pode ser mais fácil para
o tal advogado, haverá sempre uma
zona ignorada sobre a vida real daqueles que morrem em "odor de santidade", pitoresca expressão que cria
a expectativa de um novo santo.
No caso de um papa, e de um papa
de intensa exposição como João Paulo 2º, a tarefa desse advogado será
mais difícil. Não bastará a negação
das virtudes pessoais que constituem
a base para a canonização. Ele terá
de especular sobre as conseqüências
do pontificado que se encerrou -e
isso demanda tempo e perspectiva.
No caso de um papa que mais santos
elevou aos altares, a pressão do povo,
talvez pela primeira vez na história
da Igreja Católica, será decisiva e
mandará o advogado do diabo ao
diabo.
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