São Paulo, terça-feira, 11 de maio de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MARCOS NOBRE

Quanto custa um capitalismo

QUEM LÊ O NOTICIÁRIO sobre a crise na Grécia pode achar que se trata de um problema econômico simplesmente. O problema de como administrar uma moeda multinacional.
A Europa seguiu ontem a estratégia dos EUA em 2008. Liberou uma quantidade colossal de recursos com o recado: se quiserem especular contra a Grécia, contra o euro, contra a Europa, vão perder dinheiro. Essa linguagem o "mercado" não apenas entende; também, e principalmente, agradece.
Tudo resolvido? Claro que não.
Porque a crise do euro não é uma crise econômica simplesmente.
Porque o euro não foi um projeto econômico simplesmente.
Para começar, o euro teve a ambição de ser contraponto à hegemonia mundial solitária dos EUA a partir dos 1990. Mas pretendeu sobretudo defender um modelo de capitalismo que seria próprio da Europa. Foi para preservar o quanto possível desse modelo que a Comunidade Europeia se tornou União Europeia, expandiu fronteiras e criou uma moeda comum.
Não que seja o paraíso na Terra, evidentemente. As diferenças internas são enormes, o modelo é mais imaginário do que real. Nem todo país é Suécia ou Alemanha. As dificuldades de financiamento são notórias.
Mas, pelo menos, é um modelo baseado na proteção social para quem vive do trabalho. Que pretende aliar democracia supranacional com coisas básicas, como poder sair à rua sem temer pela própria vida. É bem mais do que se pode encontrar nos EUA. Ou na China. Para não falar no Brasil, que nada tem de modelo, mas que segue o padrão europeu quando o assunto é escrever uma Constituição.
É um pesadelo imaginar que a grande crise do neoliberalismo alucinado dos anos 1990 acabará por puxar para o túmulo também o projeto de um modelo social de âmbito europeu. Mas essa parece ser hoje a tendência.
Não que o euro vá desaparecer, ou que algum país vá deixar o euro.
Nem que a União Europeia vá desaparecer. Mas o grau de integração tende a regredir. As instâncias supranacionais tendem a perder força e poder. A necessidade de elevar ainda mais os gastos públicos para financiar vários países ao mesmo tempo deve colocar a Europa em um ritmo ainda mais medíocre de retomada econômica.
Quando finalmente sair da crise, a Europa terá já perdido terreno precioso no campo internacional.
Porque o euro não é o dólar. Mas também porque, segundo a cartilha econômica ortodoxa, esse modelo de capitalismo é caro demais.
Imitar o modelo propagandeado pelos EUA sai muito mais em conta. Para não falar no capitalismo chinês, que é uma verdadeira pechincha social e política.

nobre.a2@uol.com.br


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Plínio Fraga: Mamãe urso na TV
Próximo Texto: Frases

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.