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OTAVIO FRIAS FILHO
Três coisas
A candidatura Ciro Gomes parece sofrer um deslocamento interessante. Depois que pesquisas eleitorais colocaram o ex-governador em
situação de empate técnico com o candidato do governo, José Serra, a postulação daquele ganhou corpo. O PFL
mantém um pé em cada canoa, numa
cisão a ser cimentada tão logo uma delas garanta a passagem para o segundo turno.
O empresariado procura dar mais
atenção a Ciro; a mídia também. Na
mesma medida, o candidato abandona um pouco do tom alternativo até
agora dado a sua campanha: mostra
empenho em organizar suporte partidário mais amplo, abranda os ataques
ao atual governo, enfatiza que para
governar um país como o Brasil é necessário negociar e fazer alianças.
Antes, seu espaço parecia restrito à
faixa de insatisfação com o binômio
governo/PT. Agora, embora os recursos políticos à disposição de Serra ainda sejam imponentes, surgiu a possibilidade de que o anti-Lula venha a ser
Ciro, não Serra. Daí o "reposicionamento", como dizem os marqueteiros, de sua candidatura, mais próxima
do "establishment".
O leitor que acompanha o vai-e-vem
da política diária se recorda da polêmica decisão da Justiça Eleitoral de
verticalizar as coligações, exigindo
que alianças no âmbito federal fossem
replicadas na esfera estadual. O argumento era organizar e favorecer a consistência ideológica do quadro eleitoral. Partidos sem candidato a presidente ficaram livres nos Estados.
O resultado concreto é dos mais esdrúxulos: Orestes Quércia de mãos
dadas com o PT, que por sua vez está
coligado ao PL evangélico, o qual
apóia Paulo Maluf para o governo do
Estado de São Paulo. Por mais que a
geografia ideológica esteja transtornada no mundo inteiro, é incrível que o
PT se tenha aliado não a um partido
de centro, mas de direita pura e simplesmente.
Essa geléia geral tem a ver com o colapso de reais alternativas, um fenômeno internacional, responsável,
aliás, pela primazia gerencial e "moral" na avaliação de candidaturas. Os
programas, ressalvados detalhes técnicos e fantasias de marketing, são
quase os mesmos. O problema somente se acentuou com a desastrada
intervenção do TSE.
Surpreende o fôlego do malufismo
em São Paulo. Como é possível que lidere as pesquisas para governador de
São Paulo um político tão desgastado,
acusado de um sem-número de irregularidades, associado à imagem de
mentira, mandonismo e brutalidade,
adepto de uma visão estreita e anti-humanista de administração pública,
flor populista do pântano ditatorial?
O eleitorado de Maluf, cerca de um
terço dos votos, tem se mostrado "inelástico" para cima ou para baixo, como dizem os economistas. É a parcela
da opinião pública que pensa a política como Maluf. A angústia com a insegurança pública pode acrescentar a
fração que falta para uma vitória em
primeiro turno, ainda improvável,
mas talvez sua única chance.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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