São Paulo, Domingo, 11 de Julho de 1999
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O mal-estar do ganhador

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Está no Relatório sobre o Desenvolvimento Humano, versão 1999, a ser divulgado oficialmente amanhã pelas Nações Unidas:
"Os mercados não são nem a primeira nem a última palavra no desenvolvimento humano. Muitas atividades e bens essenciais ao desenvolvimento são fornecidos fora dos mercados, mas estão sendo gradualmente eliminados pela pressão da concorrência mundial."
Nada de muito diferente do que o leitor poderá ter lido em quem não se dobrou à ditadura do chamado "pensamento único", o receituário neoliberal que recomenda deixar tudo ao livre arbítrio do mercado.
O que há de espantoso no trecho acima reproduzido é o fato de um organismo internacional se sentir compelido a dizer coisas tão óbvias, porque ficaram soterradas pela adoração dos mercados.
O relatório da ONU é, acima de tudo, um libelo contra a globalização nos termos em que ela foi imposta ao planeta. Ou contra a "globalização assimétrica", para usar expressão de Fernando Henrique Cardoso, feliz expressão mesmo vinda de quem não faz nada, rigorosamente nada, para diminuir a assimetria.
Como as vítimas da assimetria não se mexem, talvez a esperança de uma mudança possa ser posta exatamente no lado oposto, nos ganhadores. Pesquisa recente da Battleground norte-americana, empresa bipartidária conduzida por um republicano e um democrata, mostra que a maioria absoluta dos americanos (51%) acha que as coisas se movem na direção errada. Mostra igualmente que o pessimismo sobre o futuro supera o otimismo por 15 pontos percentuais, quando o usual é um equilíbrio relativo.
Estamos falando de um país que cresce há sete anos consecutivos e que é visto como o líder mundial incontrastável. Se os ganhadores se sentem mal, talvez as coisas comecem a mudar. Só assim, aliás, porque os perdedores renderam-se.


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