São Paulo, Domingo, 11 de Julho de 1999
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O ACORDO DO FHC 2

A opinião pública espera há meses a recomposição de um governo estremecido pela derrocada da política do real forte, pelos efeitos sociais da recessão e pelo subsequente tumulto na coalizão fernandina, que tem se dedicado a uma azáfama de intrigas diante da fragilidade presidencial.
O aspecto ora mais em evidência da apatia governativa é o político. Espera-se para os próximos dias a confirmação da abulia ou algum indício de que o presidente está disposto a dar algum basta às pressões dos aliados, que mais e mais furtam sua autonomia e desbastam a governabilidade.
O presidente parece preparar uma reforma ministerial. Praticamente chancelou o casuísmo no episódio Ford/Bahia, com o que permanece a sombra de Antonio Carlos Magalhães sobre seu governo, embora o poder do senador seja mais periférico do que se divulga, mesmo que cause embaraços políticos e de imagem. Há indícios de que o presidente pretenderia ainda trilhar o caminho da composição também no remanejamento do ministério.
O que pode estar se armando, pois, é um grande acerto para o segundo mandato. O programa de conciliações já estaria em curso, por exemplo, na folga fiscal a Estados e municípios. O governo federal parece querer aplacar a revolta dos novos governadores, que vem do início do ano, com uma grande rodada de acordos financeiros e rolagens de dívidas.
Há pouco, FHC reuniu os presidentes do Senado, da Câmara e do STF para aliviar a tensão entre essas instituições. Tal disputa, que chegou a insultos, fazia fermentar a desordem no Congresso, entre líderes da coalizão governista, e poderia afetar interesses do Planalto no Supremo, onde se decidem causas essenciais para o sucesso do ajuste fiscal.
Mas, se quiser demonstrar autoridade, indicar rumos para o país e impulsionar as reformas, o presidente teria de encontrar uma nova fórmula para exercer o poder. Decerto ela não poderá ser a da infinita conciliação, da tolerância indevida com mesquinharias de seus aliados.
Ainda assim, FHC tem sob seu comando direto os condutores da economia e da política social. Estaria mais livre, pois, para imprimir alterações de rota nessas áreas. Mas na economia a grande mudança foi forçada -a desvalorização. O novo esteio da política econômica, se corrige o desastre da âncora cambial, não afeta a passividade nesse setor. No mais, há uma tentativa de auxiliar a reestruturação industrial -fusões e ganhos de escala- em alguns setores-chave; há as políticas tópicas do BNDES, que vêm do primeiro FHC.
O teste desse tímido e pouco renovado programa econômico virá em 2000, se o país voltar a crescer. Há o risco de que, com a economia em movimento, o Brasil continue a ter problemas nas contas externas por excesso de importações. Voltaria a dependência também excessiva de financiamento externo, sempre uma ameaça ao crescimento sustentado.
Há, portanto, o risco de FHC estar apenas reorganizando as peças algo lascadas do quebra-cabeças do primeiro mandato; a peça nova seria apenas a cara política de apaziguamento dos governadores.
Na política, refaz-se o arranjo da coalizão; mantêm-se os conciliábulos e não se vislumbra acerto para aprovar as reformas no Congresso.
Na economia, a nova âncora não é acompanhada de novidades na política industrial e, assim, pode-se reeditar, sem o programa suicida do real forte, o liberalismo trôpego do primeiro mandato. Ao que parece, afigura-se para o segundo FHC a velha estratégia de mudar para manter.


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