São Paulo, segunda-feira, 11 de novembro de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

A urgência de ser feliz

RIO DE JANEIRO - Jovem universitária enviou-me alguns poemas que havia feito e desejava minha opinião. Elogiei-lhe a produção, apesar do tom adolescente da maioria dos versos, que podiam ser resumidos num único, justamente o primeiro verso do primeiro poema: "Se tenho de ser feliz, quero ser feliz já!"
O título era óbvio: "Urgência". A moça tinha pressa em ser feliz, em realizar seus sonhos, em viver a sua vida. Para meu espanto, ela ficou aborrecida. Disse que o verso nada mais era do que o início da letra de uma música da qual não guardei o nome, sucesso que esteve nas paradas uma porrada de tempo, ela desculpou a minha ignorância, reconhecia que a música não fazia o meu gênero.
Lembrei este verso quando li a história da moça Suzane, também universitária, que tinha de ser feliz já. E, para ser feliz imediatamente, voando, combinou com o namorado a morte dos pais, abriu-lhe a porta da casa, o rapaz com a ajuda de um irmão, matou o pai e a mãe da moça, a pauladas, enquanto o casal dormia.
Os pais eram contra o namoro, ela não podia ser contrariada, tinha de ser feliz já, imediatamente, voando, o jeito foi eliminar os pais. Além de ficar livre deles, dividiria com um irmão os bens do casal, poderia ir morar onde bem entendesse, ser feliz da maneira que escolhera, na urgência que a vida lhe impunha, sem esperar pelo futuro que poderia começar quando quisesse. Era só dar uma força ao destino -e foi o que ela fez. "Se tenho de ser feliz, quero ser feliz já!""
O crime horrorizou São Paulo, horrorizou o Brasil. Gente quadrada que não entende a urgência que o sonho impõe e que os caretas e bregas -que somos a maioria- não compreendemos.
Suzane é bonita, matou os pais, chorou por eles no cemitério e fez o que podia para ser feliz já. Acabou-se.



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