São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 2003

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VINICIUS TORRES FREIRE

Bichos de duas cabeças?

SÃO PAULO - Haveria o risco de a diplomacia brasileira estar virando um bicho janicéfalo, um monstro de duas cabeças (janicéfalo, de Jano, o deus romano de duas faces)?
Trata-se, por ora, apenas de uma dúvida. Mas tornou-se claro, depois de algumas nomeações para o governo de Lula da Silva, que certas burocracias contam agora com figuras de orientação a princípio opostas, de linhas teóricas diferentes, ao menos incongruentes no conteúdo político. Há exemplos ou ameaças disso no segundo escalão do Ministério da Fazenda e no Ministério do Desenvolvimento/ BNDES.
Na diplomacia, a hábil e competente personalidade do embaixador e ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, embora mais à esquerda que a de seus antecessores, parece apta a conciliar a necessidade de mais independência na política externa com pragmatismo.
Amorim tem como seu secretário-executivo o deveras esquerdista Samuel Pinheiro Guimarães, motivo de séria crise no insípido, inodoro e incolor Itamaraty de Celso Lafer e FHC. Mas tem também o muitíssimo mais pragmático Clodoaldo Hugueney no comando de negociações comerciais. Mais, a diplomacia nacional conta agora com um assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia, muito próximo de Lula, obviamente à esquerda.
Nos bastidores da investida brasileira na Venezuela há impressão de ruído, que pode ser apenas isso. Pode bem não ser. Garcia parece mais pró-Chávez. O Itamaraty, talvez até por ter funções executivas, parece mais cauteloso. De resto, a intenção dos norte-americanos de voltarem a ser publicamente ativos na Venezuela suscitou ainda mais dúvida.
Os EUA se irritaram com o fato de o Brasil ter colocado suas asas de fora e trataram de arrumar uma política em contraposição? Parte da diplomacia discute com os norte-americanos um encaminhamento do salseiro venezuelano, enquanto outra parte não quer saber dos EUA?



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