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ELIANE CANTANHÊDE
O país dos milhões
BRASÍLIA - Tudo no Brasil é espetacular e grandioso, basta ver a pujante foto de Marlene Bergamo ontem na capa da Folha, com aquela
massa de milhões de pessoas na Parada Gay da avenida Paulista.
Nada é modesto, tudo é contado
aos milhões: na Parada Gay, na visita do papa, nos encontros evangélicos, nos desvios políticos, na corrupção, nas estatísticas, no desemprego, na miséria. E, como se contam os desvios em milhões de reais
ou de dólares, contam-se os implicados e presos às dezenas. Mas nada muda. Num mês fora, e descontando-se as notícias do papa, só era
possível saber que a operação X da
Polícia Federal havia prendido 50
poderosos, uma nova operação Y
havia prendido mais 60, e outra
operação Z tinha prendido mais 40.
Ninguém consegue lembrar o
nome da operação da semana passada, nem do mês passado, quanto
mais a do ano passado. O país vai
acabar "comemorando" seu primeiro milhão de presos ilustres,
mas são presos de horas, de dias,
que saem das prisões, das páginas e
dos telejornais de fininho, à francesa, prontos para outra. Logo voltam, lépidos, fagueiros e... eleitos.
A sensação é de que o importante
são os números, as dezenas de presos, os milhões desviados, sem conseqüência. Na soma, na multiplicação e na divisão, o que sobra é que
as prisões estão sendo banalizadas
(afinal, quem ainda não foi preso?)
e a impunidade continua igualzinha. O que aconteceu com os indiciados da PF, os apontados pelas
CPIs, os denunciados pelo Ministério Público, os réus da Justiça? Os
escândalos são tantos, os escandalosos são tão disseminados, os valores tão astronômicos. Mas estão virando parte do dia-a-dia.
Não se usa o "grampo" com parcimônia, não se preserva o constrangimento que significa -ou significava- uma prisão e nem se acaba de fato com a impunidade. Tudo
parece tão corriqueiro que dá pena.
Pena do país dos milhões.
elianec@uol.com.br
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