São Paulo, segunda-feira, 12 de agosto de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

BORIS FAUSTO

O acordo e os candidatos

O acordo firmado entre o Brasil e o FMI é altamente positivo, desde que o analisemos dentro do contexto e não nos dediquemos a examiná-lo em abstrato. Chovendo no molhado, lembro alguns pontos essenciais: o volume dos recursos obtidos; a manutenção do nível de compromisso de superávit primário, correspondente a 3,75% do PIB; a redução do piso de reservas que o país se obriga a manter.
Ao mesmo tempo, convém ressaltar que o acordo não é um presente de Papai Noel no mês de agosto, pondo fim aos nossos problemas econômico-financeiros. Ele representa, isso sim, uma ferramenta importante para a condução menos tempestuosa da política financeira do país.
Na explicação de um ajuste que até há alguns dias parecia difícil e, nas condições obtidas, impossível, a maioria dos analistas tendeu a acentuar a reviravolta no comportamento do governo Bush e do FMI. Sem dúvida, eles têm razão em dizer que, por fim, o governo americano despertou para o risco sistêmico, existente em toda a América Latina, acabando por descobrir que a região não se limita ao vizinho México e à conflagrada Colômbia.
No caso, não se trata apenas de proteger os interesses das corporações americanas -o que obviamente não é pouco-, mas de cortar um rastilho de pólvora ainda mais abrangente.
Ao acentuar essa dimensão, devemos ressaltar também que oito anos de um governo responsável, não vergado aos interesses externos -as duas dimensões são compatíveis-, e o papel preponderante desempenhado pelo presidente Fernando Henrique nas negociações foram vitais para que se chegasse a um resultado positivo.
Como o ajuste prevê desembolsos muito maiores após a eleição do novo presidente da República, que, para tanto, deverá respeitá-lo, torna-se vital analisar a reação explícita dos candidatos.
Por motivos diametralmente opostos, não há muito o que discutir nas reações de Serra e Garotinho. Serra, como seria de se esperar, apóia com todas as letras o acordo e anuncia a manutenção de Armínio Fraga na presidência do Banco Central, caso seja eleito; Garotinho dedica-se à retórica de sempre de um populismo anacrônico.
Quanto a Lula e o PT, é preciso reconhecer que sua atitude foi, em linhas gerais, responsável, situando-se nos limites de uma oposição que, sem deixar de ser oposição, dá sinais de perceber o que seja o interesse nacional em momentos de crise.
Infelizmente, o mesmo não se pode dizer do candidato Ciro Gomes. Seu comportamento representa mais um preocupante exemplo do que poderá significar sua eventual vitória nas eleições de outubro. Navegou e provavelmente continuará navegando num mar de ambiguidades, entre a crítica irresponsável ao acordo e a aparência de um ""meia-volta volver", diante dos estragos que suas declarações imediatamente provocaram.
Essa atitude é tanto mais estranhável quando, conversando com seus botões, Ciro Gomes bem sabe que, sem acordo, o eleito -seja ele quem for- herdaria um quadro infinitamente mais grave do que o atual.


Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: O tédio da sucessão
Próximo Texto: Frases
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.