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Grampo controlado
É preciso reformar a legislação frouxa que dá a autoridades um grau de arbítrio incompatível com a Constituição
NUM PAÍS em que o presidente do Supremo
Tribunal Federal se vê
objeto de escutas telefônicas clandestinas, não há dúvida de que o direito à privacidade, garantia fundamental num
regime democrático, encontra-se ameaçado. Não apenas a arapongagem ilegal preocupa: mesmo nos procedimentos autorizados pela Justiça, sinais de excesso intromissivo surgem com relativa freqüência no noticiário.
A Comissão de Constituição e
Justiça do Senado aprovou anteontem um projeto de lei com
inovações positivas nessa questão. Passa-se a exigir, por exemplo, que sejam mais fundamentados os pedidos de quebra de sigilo telefônico feitos pela polícia.
Consideram-se inutilizáveis, no
processo, os registros de conversas entre o suspeito e seu advogado. Penas severas são previstas
ao servidor público responsável
por escutas clandestinas.
Se o projeto for à frente, vão
aumentar em detalhamento as
normas destinadas a reger o assunto, datadas de 1996. Ao mesmo tempo, não se trata de diminuir o alcance de um recurso investigativo indispensável, num
ambiente em que a sofisticação
do crime desafia como nunca o
engenho das forças da lei.
Também o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) tratou de regulamentar os procedimentos a serem seguidos pelas autoridades
na realização de escutas telefônicas. O órgão estipulou diversas
normatizações de ordem técnica
que, embora incapazes de prevenir eventuais ações desmedidas
de um juiz de primeira instância,
obrigam-no a embasar circunstanciadamente a sua decisão.
Num único aspecto, entretanto, o CNJ incorre no risco de ingerência sobre decisões judiciais.
Ele determinou que todo magistrado deverá informar mensalmente a quantidade de interceptações telefônicas que autorizou.
O perigo, a ser evitado, é essa medida degenerar numa espécie de
supervisão estatística, lançando
uma sombra de desconfiança sobre os magistrados que mais ordenam quebra de sigilo.
Abusiva ou não, a decisão individual de um magistrado é soberana. Se for o caso de responsabilizá-lo por erros cometidos, eis
algo que pode ocorrer apenas "a
posteriori", num devido processo legal.
O Conselho Nacional de Justiça tem atribuições puramente
administrativas. A tabulação numérica dos grampos, portanto,
poderá ser usada legitimamente
apenas para constituir um banco
de dados -o que, de resto, contribuirá para tornar mais transparentes os atos da Justiça.
Controlar ao máximo o poder
das autoridades é uma preocupação que deve ser constante no
Brasil. A investigação de criminosos e o combate à impunidade
no país não podem ter como custo o desrespeito generalizado a
garantias fundamentais, como o
direito à privacidade. Chegou a
hora, portanto, de reformar a legislação frouxa que hoje confere
a servidores inconseqüentes um
grau de arbítrio incompatível
com a Constituição.
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