São Paulo, terça-feira, 13 de janeiro de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

Bonés e camisas

RIO DE JANEIRO - É o presidente da República mais popular que tivemos. Nem JK, nem Vargas, que tiveram seus momentos durante e sobretudo depois de seus mandatos, alcançaram a empatia com o homem comum, que fica além e acima do desempenho específico das funções de chefe de governo e chefe da nação.
JK enfrentou duas rebeliões militares durante o seu governo, e Vargas, na sua primeira fase, tinha a boca de fogo que era o DIP, que o vendia como salvador da pátria. Mesmo assim, apesar da ditadura e do DIP, ele conseguiu ser amado pelo povo, mantendo sua austeridade pessoal que o proibia de vestir camisas de clubes esportivos e de colocar na cabeça o boné que um grupo circunstancial lhe oferecesse.
Lula não tem a austeridade de Vargas nem a força de vontade de JK para realizar o que deseja. Vai na onda, agradando ou tentando agradar a gregos e troianos. Agora mesmo, enquanto aparece com uma camisa do Flamengo, manda dizer ao pessoal reunido na Índia que o seu governo é de esquerda.
Se fosse, não precisava dizer. E tem mais: do jeito que coloca a dicotomia esquerda-direita, Lula parece que não superou o bê-á-bá ideológico, o elementar em matéria de ação política. Ser da esquerda lhe parece o supra-sumo do bem, daí a reivindicação de que é de esquerda. A classificação que atribui a seu governo é discutível. Vamos lá: recusou-se a entrar na Guerra do Iraque, continua pessoalmente omisso na questão dos turistas norte-americanos que visitam o Brasil, deixando o assunto para o Judiciário e para a Polícia Federal.
Promete todos os dias "mudar as regras do jogo", mas, logo de saída, nos primeiros minutos da partida, fica embananado sem saber que time botar em campo.
Para todos os efeitos, Lula está se revelando um presidente mais do que comum, sem um plano de ação nítido e sem uma equipe capaz de realizar o que dele se esperava.


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