São Paulo, Sábado, 13 de Fevereiro de 1999
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Evangelizar a América

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

A exortação pós-sinodal que o papa João Paulo 2º assinou e entregou aos bispos no México, a 23/1/99, constituiu para as comunidades católicas um convite a valorizar o dom da fé, recebido há cinco séculos em nosso continente. Mas, para todas as pessoas interessadas na concórdia social e na paz, o texto oferece elementos para uma profunda reflexão e mudança de atitude.
O documento com o título "Igreja na América", após introdução sobre o sentido da assembléia sinodal realizada em Roma, de 16/11 a 12/12/97, trata em seis capítulos do encontro, na fé, com Jesus Cristo ressuscitado. Precisamos reconhecer sua presença na Sagrada Escritura lida à luz da tradição, na liturgia e na pessoa de cada irmão, especialmente nos pobres, com os quais Jesus mais se identifica. Cristo é caminho de conversão pessoal e social, de comunhão e solidariedade. A parte final do texto convoca a igreja para anunciar o Evangelho com particular atenção aos mais afastados da comunidade eclesial no próprio continente e para além de suas fronteiras. A "Nova Evangelização" há de nos preparar para entrarmos sem medo, com a presença e proteção de Jesus Cristo, no terceiro milênio.
Várias proposições sinodais nos ajudam a compreender a complexa condição dos destinatários da ação evangelizadora da igreja.
Um primeiro conjunto de elementos converge para marcar a identidade cristã de nosso continente, fruto dos grupos migratórios da Europa ao longo destes 500 anos: a) há um patrimônio de valores morais que tem por raiz a mensagem do Evangelho sobre a dignidade da pessoa, o matrimônio, a família e o trabalho; b) a história da evangelização apresenta inúmeros santos, entre os quais muitos mártires que selaram com o sangue o testemunho de sua fé; c) existe intensa piedade popular na variedade de suas formas, como a oração em família, a devoção mariana e a peregrinação aos santuários; d) houve forte influxo na formação cristã dos americanos por meio da educação nas escolas e universidades; e) multiplicaram-se as iniciativas na área social e caritativa nos asilos, hospitais e centros sociais; f) a vivência do Evangelho fortaleceu a promoção dos direitos humanos e a luta por uma sociedade justa, solidária e democrática.
No entanto, a atual ação evangelizadora deverá defrontar-se com vários desafios: a) a tendência à globalização atribui valor absoluto à economia e acarreta o desemprego, o aumento da diferença entre ricos e pobres, o deterioramento dos serviços públicos e a destruição da natureza; b) o fenômeno da urbanização e do êxodo rural leva à perda dos costumes familiares e das tradições religiosas; c) cresce o peso da dívida externa, não raro fruto da má administração e da corrupção, que envolve sempre mais pessoas e estruturas públicas e privadas; d) parece incontrolável o drama da produção, do tráfico e consumo de drogas, que atinge principalmente os jovens; e) como evitar os prejuízos ecológicos e a agressão ao meio ambiente, que causam danos irreparáveis quanto aos microorganismos, à biodiversidade e à conservação do planeta?
Diante desses e de outros desafios, o documento "Igreja na América" apresenta Jesus Cristo como "caminho, verdade e vida" para toda a humanidade e renova a mensagem de esperança de um mundo marcado por justiça, diálogo e solidariedade e aberto à transcendência dos valores espirituais do nosso encontro definitivo com Deus.


D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.


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