São Paulo, quinta-feira, 13 de maio de 2010

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Novos conservadores

Herdeiros de Thatcher voltam ao poder em coalizão incomum, a ser testada pela crise econômica europeia

APÓS 13 ANOS de maioria trabalhista no Parlamento britânico, o Partido Conservador retorna enfraquecido ao poder. Os herdeiros de Margaret Thatcher venceram as eleições gerais da semana passada, sem no entanto obter maioria absoluta na Câmara dos Comuns.
Aliados aos liberais-democratas, legenda coadjuvante na política do Reino Unido, conseguiram fazer de David Cameron, 43, o líder de uma coalizão incomum, a ser imediatamente testada pela crise econômica que afeta o continente europeu e ultrapassa o canal da Mancha.
De certo modo, a situação do Reino Unido não é muito melhor do que a de Portugal e Espanha, sempre apontados como as próximas vítimas da especulação contra governos europeus com dificuldades para pagar suas crescentes dívidas.
As duas nações ibéricas registraram deficits orçamentários de cerca de 9% e de 11% do PIB em 2009. O Reino Unido, de 11%. Portugal tem uma dívida pública de 77% do PIB. Os britânicos devem o equivalente a 68%.
É fato que o Reino Unido não adotou o euro, o que aumenta a sua margem de manobra econômica. Conta, ao mesmo tempo, com uma economia muito maior do que a dos vizinhos ao sul. Mas terá de reduzir os deficits.
As dificuldades econômicas exigem equilíbrio orçamentário, que pode ser alcançado com corte de gastos ou mais impostos. A primeira solução foi adotada de maneira radical por Thatcher na década de 80, mas os novos conservadores não têm meios nem disposição para usar apenas esse instrumento.
Thatcher pôde fazer caixa ao vender empresas estatais e assim compensar cortes de impostos. Tal recurso esgotou-se.
O progressivo deslocamento dos conservadores para o centro do espectro político, onde se encontram todas as principais legendas do país, impede cortes em gastos sociais. Cameron é defensor do sistema público de saúde do Reino Unido. Ele e seu vice-premiê, o liberal-democrata Nick Clegg, incluíram entre os itens do programa de governo um aumento dos recursos para atendimento médico.
A nova coalizão cortará gastos, por certo, mas terá que aumentar a arrecadação. Mal tomou posse, já anuncia a intenção de elevar alíquotas dos impostos sobre herança e renda.
Thatcher revitalizou a economia do país ao desregulamentá-la e fazer de Londres um vibrante centro financeiro. Cameron e Clegg herdam uma crise que nasceu da liberdade de movimentos conferida ao setor bancário, que pretendem regulamentar.
Mesmo se o crescimento econômico for retomado, a tarefa não será fácil. Cameron não tem o controle total de seu partido ou de seu governo. Comprometeu-se com os novos aliados a realizar um plebiscito que pode alterar o atual sistema de voto distrital no Reino Unido -se aprovada a mudança, o próprio Partido Conservador tende a se enfraquecer.
Ainda é difícil saber até que ponto seus correligionários aceitarão ir, tanto quanto se será sustentável a aliança a que se lançaram para selar a volta ao poder.


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