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ALBA ZALUAR
Pátria mãe
A POLÍTICA social é sempre
cheia de ardis. Um deles é o
de deformar a generosidade
do Estado, imposta ao contribuinte, quando faz de portadores dos
benefícios seres infantilizados pela
dependência. Há muito tempo artistas populares falam da esmola
como vício do cidadão que infantiliza o pobre e encolhe a possibilidade de que venha a retirar o lábio do seio pátrio gentil. Não é tanto o limite objetivo da renda, mas essa
postura subjetiva que diferencia o
indigente do pobre que aposta no
seu valor pessoal.
Não há como criar cidadãos sem
destruir essa dependência que impede o desenvolvimento das habilidades, da auto-estima e do sentido do valor próprio da pessoa, além
da capacidade de julgamento independente. A política pública do século 21, por isso, invoca a retribuição pela benesse recebida para se
livrar dos caronas, aproveitadores
e viciados em auxílios, facilmente
transformados em claques e massa
de manobra de governos.
Mas não é verdade que os pobres
no Brasil padeçam desse mal que
assusta os planejadores das políticas públicas no mundo todo. Ao
contrário, o que impressiona quem
convive com eles em pesquisas de
campo é o valor dado ao esforço
próprio, a correr atrás, a estudar
para vencer na vida, expressões
que ouvi nas favelas do Rio de Janeiro por quase 30 anos.
Todavia, ocorre no Brasil de agora fenômeno peculiar. Para compensar a falta de emprego e a falta
de reformas nos planos de cargos e
carreiras em setores cruciais, aumentam-se o número e os tipos de
bolsas. No projeto Pronasci, do Ministério da Justiça, que pretende
aprimorar a política de segurança
pública no país todo, foram criadas
bolsas para "reservistas cidadãos",
para "jovens em situação de risco",
para "mães da paz" e para "agentes
da segurança que recebam até
1.300 reais de salário".
Em cada um desses beneficiários, pode-se reconhecer atores
fundamentais para tornar eficaz
qualquer plano de prevenção da
violência e de segurança cidadã. O
truque, no entanto, está em delinear quais serão os resultados obtidos por cada uma dessas categorias
de portador de bolsa e como avaliá-los. Para alguns, isso está claro, para outros, como as mães da paz e os agentes de segurança bolsistas,
não.
Não custa lembrar que cuidar de
si mesmo de modo a não se tornar
fardo para os outros, desenvolver
as próprias capacidades, investir
na formação profissional são retribuições ao benefício recebido tão
importantes quanto cuidar dos
mais vulneráveis, criar laços sociais que fortaleçam o espírito de
cooperação e solidariedade entre
os mais próximos. O contribuinte
que paga a conta espera que isso
não seja esquecido.
ALBA ZALUAR escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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