São Paulo, sábado, 14 de janeiro de 2006

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CARLOS HEITOR CONY

Ênio Silveira

RIO DE JANEIRO - São dez anos da morte de Ênio Silveira, o editor que deu ao livro o formato que hoje conhecemos, com os naturais acréscimos de um mercado ao mesmo tempo exigente e complicado.
Para o pessoal do ramo editorial e cultural, seria ocioso recordar o que ele fez. Preso pelos militares, teve destruído o prédio de sua editora e cassados seus direitos políticos.
Quero lembrar a sua atuação nos dias de 64 em diante, quando jogou tudo o que tinha na luta contra o arbítrio. Ele ainda não havia entrado para o Partidão, mas na sua editora se costurava a primeira ação concreta (não armada) contra o regime. A turma que, no "Correio da Manhã", abrira o primeiro combate contra a ditadura, desabou por gravidade na Civilização Brasileira, da qual alguns já eram editados, como Antônio Callado e eu próprio, vindo depois Paulo Francis.
Foi no gabinete de Ênio (mais tarde na casa de uma prima dele) que Renato Archer costurou a Frente Ampla. Era ligado à editora Paz e Terra, que funcionava como um dos selos da Civilização. Ênio já entrara para o PCB e os dois atraíram outro editor, Carlos Lacerda, que seria, com Renato Archer, operador da Frente. Pretendia-se criar um poderoso bloco contra o regime. (Neste ano, a editora de Lacerda, a Nova Fronteira, está fazendo 40 anos).
A Frente Ampla seria o espectro da sociedade civil. Esquematicamente, Lacerda seria a direita, Jango a esquerda e Juscelino o centro. Para que os comunistas não atrapalhassem (o PCB atrapalhou o que podia), Ênio foi designado pelo Partidão para as reuniões preparatórias com Renato Archer. Os dois adversários, Ênio e Lacerda, chegaram a se tornar amigos. Vi um chorando no ombro do outro.
A Frente foi fechada, mas assustou de tal forma os militares que, quando houve um pretexto mais ou menos banal, o discurso do Marcito na Câmara, o regime assumiu a truculência com o AI-5.
Daí em diante, a resistência só poderia ser a luta armada.


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