São Paulo, Domingo, 14 de Fevereiro de 1999
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A vingança tardia de Marx

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Os velhos marxistas passaram a vida esperando e torcendo pela "crise final do capitalismo". A crise final do comunismo veio antes.
Mas, agora, podem experimentar um tardio sabor de vingança. Se o capitalismo, "latu sensu", continua robusto e, o que é pior, sem alternativas à vista, está explodindo a crise de uma variante do capitalismo dada pela hegemonia do capitalismo financeiro sobre o produtivo.
Basta ler o que dizem expoentes nada marxistas dos dois lados do balcão. "Precisamos estabelecer um novo sistema para estabilizar os mercados financeiros. Do contrário, a repetição de crises após crises vai resultar em um grande derretimento do sistema financeiro mundial", diz Eisuke Sakakibara, que, como responsável pelas finanças internacionais do Japão, é quem defende a moeda do país.
"A tese de que o mercado tende a levar as coisas ao equilíbrio pode se aplicar a bens e serviços comuns, mas não funciona para mercados financeiros, que são inerentemente instáveis", ecoa George Soros, cujo esporte favorito é atacar moedas.
Completa Gerhard Schroeder, o novo chanceler alemão: "Movimentos de capital especulativo ajudaram a conduzir (...) economias nacionais inteiras à beira da ruína".
Todas essas frases foram pronunciadas em Davos, em encontros anuais do Fórum Econômico Mundial, uma espécie de clube da elite planetária (a de Soros é do ano passado, em debate de que participou FHC).
É natural que o sociólogo mexicano Jorge Castañeda, que este ano esteve em Davos pela primeira vez (que eu me lembre), tenha concluído: "Nos encontramos em pleno pós-neoliberalismo" (artigo para o jornal espanhol "El País", publicado dia 10).
Pode até ser. Mas suspeito que estejamos, na verdade, em pleno pós-coisa-alguma, porque, se há consenso de que a coisa está feia, não há um mínimo de consenso em torno do que pôr no lugar de um sistema que Sakakibara vê em derretimento.


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