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O Peru no labirinto
JOSÉ SARNEY
As notícias sobre as eleições no Peru
foram desencontradas, esquivas, sinuosas. Só ficou uma verdade: as eleições foram fraudadas. Esse foi o consenso internacional. Inexplicavelmente, a América do Sul, com exceção da
nota do Brasil de ontem, manteve um
silêncio profundo sobre o que ali
ocorreu e ocorre. A Europa, bem distante, mobilizou-se para evitar que a
farsa eleitoral fosse perpetrada. O embaixador francês em Lima e o embaixador de Portugal, em nome da Comunidade Européia, e a secretária de
Estado americana, Madeleine Albright, protestaram contra essa derrocada da democracia no Peru. "The
New York Times" resumiu o pensamento geral sem rodeios: "As eleições
peruanas cheiram a fraude". Tanto é
verdade que não foram os mapas eleitorais que determinaram o segundo
turno, foi a pressão internacional.
A ficha democrática do presidente
Alberto Fujimori não é confiável. Ele
se submeteu à camisa-de-força da democracia sempre com reservas. Eleito,
logo de saída adotou a postura salvacionista e messiânica dos absolutistas
e deu o autogolpe, fechando o Congresso e o Supremo Tribunal. Inventou a reeleição no continente, não por
convicção, mas pelo apetite de poder.
Seu estilo populista alimenta-se de
sorteios de televisão e geladeira nos
bairros pobres de Lima.
Agora, a ferro e fogo, quis a terceira
eleição. É um Roosevelt sem a Segunda Guerra Mundial. Os juízes que não
concordaram com essa tese tiveram
de sair da Suprema Corte. O Escritório
Nacional de Processos Eleitorais, contra todas as pesquisas, contra todos os
testemunhos de organismos internacionais, anuncia um resultado com
números manipulados.
A reação internacional foi dura. Não
se podem substituir na América Latina os velhos processos ditatoriais pela
democracia autoritária, fraudada, populista, sob o manto de que o governo
é um fiel cumpridor da abertura dos
mercados.
Peru, como o México, tem uma história forte. O que foi a tragédia de Cajamarca, quando o país foi conquistado pelos espanhóis, a atrocidade de
Francisco Pizarro, está relatada por
seu irmão, Pedro Pizarro, quando refere que Pascal, guerreiro de Ataualpa,
disse que "antes que vocês cristãos
aqui chegassem, o Inca era como o
Sol".
Bartolomeu de Las Casas completou
esses relatos que até hoje nos remetem
à tragédia do Peru. Ele diz que os indígenas recomendaram a Pizarro fundar Lima em lugar tão inóspito da costa que todos os espanhóis morressem.
Do Peru levaram tudo, da prata até a
batata, cultivada nos altiplanos das
cordilheiras, que se transformou em
alimento mundial. São essas papas e
essas batatas que o senhor Fujimori
deseja dar à democracia.
O Peru, Paraguai e outros vizinhos
nos avisam que a democracia no continente não vai tão bem. Desenterremos a UDN com seu slogan: "A liberdade é a eterna vigilância". Vigiai! O
Brasil, que falou duro com Oviedo do
Paraguai, deve falar firme com Fujimori.
Que venha o segundo turno, com
eleições limpas e a vontade do povo
respeitada.
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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