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São Paulo, segunda-feira, 14 de abril de 2003

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BORIS FAUSTO

As muitas perguntas

A guerra do Iraque surpreendentemente vai chegando ao fim. Ficam, no rescaldo, as muitas perguntas para as quais nem sempre há resposta. Enumero algumas: onde estão as temíveis armas químicas e bacteriológicas que Saddam Hussein teria armazenado? o que aconteceu com a não menos temível Guarda Republicana, que teria formado dois anéis de ferro em torno de Bagdá? Uma última questão para quem gosta dos aspectos novelescos dos acontecimentos internacionais: o que é feito de Saddam Hussein?
Tudo indica que as terríveis armas do ditador iraquiano simplesmente não existem ou, se existem, não têm a importância que lhes foi atribuída, embora alguma "descoberta" de última hora ainda possa ser feita. Se somarmos essa constatação ao colapso da Guarda Republicana, concluiremos que uma grande encenação foi montada pelo governo americano para justificar a invasão do Iraque e manter a maioria da população dos Estados Unidos em um clima misto de medo e patriotismo.
Na verdade, vista retrospectivamente, a fisionomia do Iraque é a de um país esgotado pelo embargo que lhe foi imposto após a Guerra do Golfo e pelas loucuras de uma ditadura cruel. Nem mesmo o esperado e temido ataque de mísseis ao Estado de Israel, como aconteceu em 1991, veio a ocorrer. Confirma-se, assim, a tese de que uma das razões para a guerra, ainda que não a mais importante, foi o fato de o Iraque ser um país fragilizado em comparação com os outros integrantes do "eixo do mal".
Quanto ao destino de Saddam Hussein, é difícil imaginar que ele siga o caminho de Bin Laden, cujo estilo ascético lhe permitiu esconder-se nas cavernas do Afeganistão e sabe-se lá onde mais. Também é difícil imaginar que abandone a vida palaciana para refugiar-se em um país árabe como um asilado incômodo. Então, da pergunta sobre sua localização, brotam outras perguntas: estará ainda vivo? estará em Tikrit, sua cidade natal, aguardando um martírio que o converta em símbolo da resistência aos invasores anglo-americanos?
Mas todas essas perguntas referem-se mais ao passado -e algumas delas têm já uma resposta. Enquanto olhamos o presente, composto da euforia do governo americano, do caos nas cidades iraquianas, das mortes de civis -como sempre inocentes-, do aplauso ou da indignação popular contra a chamada coalizão, nascem as perguntas desafiadoras voltadas para o futuro.
Do leque de questões, duas podem ser destacadas. No plano interno, que tipo de ordem será instalado no país? Se a experiência recente do Afeganistão não vale pelas visíveis diferenças entre os dois países, também não vale a longínqua experiência, com saldo positivo, do Japão do pós-Guerra.
No plano internacional, brota outra pergunta: o Iraque "é um caso único", como afirma hoje a Casa Branca, ou os êxitos político-militares do governo Bush vão levá-lo a atacar novos prováveis integrantes do "eixo do mal", como a Síria? Como se dizia no final de cada capítulo das fitas em série, "to be continued".


Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.


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