São Paulo, sexta-feira, 14 de maio de 2004

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CHANCE PARA LULA

A concessão de habeas corpus ao jornalista Larry Rohter não chega a desfazer o grave erro que o governo cometeu na condução de sua querela contra o diário "The New York Times", mas é o bastante para demonstrar que o Brasil, apesar dos surtos autoritários do Planalto, é uma democracia sólida. Funcionou aqui o sistema de "checks and balances" (freios e contrapesos) que caracteriza o equilíbrio dos Poderes. Chamado a intervir, o Judiciário repara uma situação de claro abuso de autoridade do Executivo.
Considerando-se os princípios constitucionais do devido processo legal, do amplo direito à defesa e ao contraditório e, principalmente, o da liberdade de manifestação do pensamento -que se aplicam tanto a brasileiros como a estrangeiros residentes-, não poderia ser outra a decisão do ministro Peçanha Martins, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que não a de outorgar o salvo-conduto ao jornalista. A menos que seja cassado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o habeas corpus se mantém liminarmente até apreciação pelos demais magistrados da Primeira Seção do STJ, o que não deve ocorrer antes de algumas semanas -o suficiente para que o caso arrefeça.
Raras vezes se viu uma administração cometer tão rotundo erro de avaliação política. Em seu esforço para diminuir o impacto negativo da reportagem sobre as libações presidenciais, o governo pôs o mundo inteiro a comentar os hábitos etílicos de Lula e transformou o que qualificava como fofocas no principal assunto da República.
Se o governo recobrar o juízo que lhe faltou quando decidiu pela expulsão de Rohter, não tentará anular a decisão do STJ. Ao contrário, toma-la-á como uma tábua de salvação. Apesar de o habeas corpus poder soar como uma derrota para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, trata-se de sua melhor chance para, sem ter de admitir que errou, deixar que o caso retorne à dimensão de que nunca deveria ter saído: o esquecimento.


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