São Paulo, domingo, 14 de julho de 2002

Próximo Texto | Índice

EDITORIAIS

FMI NÃO É CALMANTE

Há anos se discute a atuação do Fundo Monetário Internacional em momentos de crise financeira de países em desenvolvimento. O desenho de suas políticas se encontra sob intenso debate, pois a posição dominante no governo dos Estados Unidos é a de confiar aos mercados os ajustes, doa a quem doer.
No entanto, das muitas possibilidades de inovação nas receitas e nos critérios do FMI, a menos sustentável é a de passar a funcionar como instrumento de curto prazo.
Afinal, a credibilidade de que o Fundo ainda usufrui nos mercados financeiros vem sobretudo da expectativa de que a instituição seja capaz de formular, implementar e monitorar programas de ajuste estrutural.
O que os mercados esperam são mudanças de médio e longo prazo nas políticas econômicas dos países em dificuldades econômicas. A prioridade é garantir o pagamento das dívidas às instituições financeiras.
Assim, não há lógica em buscar no FMI os benefícios de um calmante, remédio de curto prazo que não altera as causas profundas do estresse.
Sem dúvida é virtuosa a busca de apoio à economia brasileira neste momento. Mas não se deve esperar do remédio algo que nem sua fórmula nem as condições do paciente são capazes de assegurar.
Um título de dívida pública, interna ou externa, é sempre um contrato com o Estado. Mas um acordo com o FMI é sempre apenas um compromisso com o governo do momento. Não há força capaz de convencer os mercados de que metas e políticas de governos em fim de mandato serão honradas pelos sucessores.
O máximo que se pode esperar do FMI é apoio a um plano durante a transição ao novo governo. Mas a validade desse estratagema expira no dia 31 de dezembro de 2002.
Os mercados estão escaldados justamente com a fragilidade dos acordos com o FMI. O governo FHC já estava reeleito e parecia manter total hegemonia sobre a condução da política econômica quando firmou, em 1998, o acordo com o FMI que assegurava ao mundo a continuidade da âncora cambial. Mas ela foi por terra no início de 99, sob o mesmo presidente e a mesma equipe econômica.
Quem estará disposto a acreditar em novas promessas, compromissos e metas no final de um governo que, ademais, tem dificuldades para fazer o sucessor? E enfrenta, novamente, os efeitos de anos de adesismo a políticas econômicas que fragilizam as finanças do país?
A ida ao Fundo também pode ser uma faca de dois gumes. Os mercados, diante de mais uma rodada de reforço às reservas internacionais do país, podem tudo interpretar como nova evidência de que a fragilidade da economia é maior que a imaginada. Ou de que o país adota uma estratégia de fazer mais dívida no exterior para rolar a dívida existente, sem cuidar das condições para que a acumulação de passivos não seja explosiva.
O feitiço se voltaria contra os feiticeiros e a busca de mais ajuda poderia ser entendida como confissão involuntária de menos capacidade de controle. Tanto o governo quanto os candidatos possivelmente fariam melhor aprofundando o debate sobre o modelo econômico brasileiro.
O esforço de criar novamente a ilusão de que nada vai mudar pode resultar, como já se viu no passado recente, numa espécie de anestesia que entorpece, inviabilizando de vez a condução da política econômica que se pretendia salvaguardar.


Próximo Texto: Editoriais: ARRANJOS PRODUTIVOS


Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.