São Paulo, quinta-feira, 14 de agosto de 2008

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Editoriais

Crise na regulação

Planalto faz ligação direta com lobbies e atropela instâncias que deveriam fiscalizar os serviços concedidos

O PLANO do Planalto de montar na Anatel um comitê de homologação para mudar as regras da telefonia no interesse de dois grupos privados sofreu ontem um contratempo. Pedido de vistas da oposição suspendeu, no Senado, a sessão que aprovaria a quinta diretora da agência -indicação do PMDB teleguiada para resolver o impasse na diretoria, o qual ainda impede a compra da Brasil Telecom pela Oi.
Pela norma em vigor, um mesmo grupo pode deter apenas uma concessão para operar linhas fixas no país. A Oi (antiga Telemar) opera no Sudeste, à exceção de São Paulo, no Nordeste e no Norte; o contrato da Brasil Telecom vale para o Sul, o Centro-Oeste, Rondônia, Tocantins e Acre. As duas empresas, portanto, estão impedidas de somar as áreas de concessão em que operam no caso de fusão.
Num escandaloso atropelo do interesse público, o governo Lula não se importou em propor a reforma do modelo, responsável pelo sucesso da privatização da telefonia, antes de tomar qualquer atitude a favor da fusão. Pelo contrário, pôs-se a incentivar e a financiar o negócio: mobilizou os fundos de pensão, acionistas das teles, e abriu os cofres do Banco do Brasil e do BNDES para uma operação vedada pelas normas vigentes no país.
A mudança nas regras do jogo, a fim de que se acomodem ao fato consumado empresarial, foi oferecida como cortesia pelo Planalto. Alijadas do almoço grátis, as teles concorrentes da Oi e da BrT reclamaram, mas também ouviram do governo promessas de alteração de normas para beneficiar seus negócios. Consumidores e contribuintes assistem a tudo bestializados.
A fusão das teles arrancada a fórceps é apenas um episódio, embora exemplar, de um padrão que se estabelece no segundo mandato de Lula. Lobbies empresariais encontraram um meio simples de fazer ligação direta entre seus interesses e as decisões políticas federais. O saldo dessa confraternização para poucos, que ignora fronteiras entre público e privado, é um grande retrocesso institucional.
As agências reguladoras, que deveriam fazer a mediação isenta entre os interesses de usuários e ofertantes de serviços públicos, foram devastadas. A maioria no Congresso, acomodada como sempre à ração oferecida pelo Executivo e presa dos mesmos lobbies que influenciam o governo, mal oferece resistência.
A própria idéia de regulação entrou em crise. Em seu lugar, começa a difundir-se uma perigosa sensação de vale-tudo.


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