São Paulo, sábado, 14 de outubro de 2000

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O Brasil está pronto para ser privatizado?

SIM
Já passou da hora

CARLOS EDUARDO DE FREITAS

Em dezembro de 1994, quando sofreu intervenção do Banco Central, o Banespa estava quebrado, com buraco superior a R$ 30 bilhões. Tal desequilíbrio era proveniente de empréstimos direta ou indiretamente feitos ao governo do Estado de São Paulo. Empréstimos impagáveis, desrespeitando os princípios mais elementares da boa técnica bancária.
Não foi um caso isolado. Os bancos oficiais estaduais foram fábricas de esqueletos fiscais, que afloraram, na sua maior parte, na segunda metade dos anos 90, em função da estabilidade monetária que acabou com os ganhos extravagantes do "float" inflacionário. Os créditos eram concedidos por critérios políticos; os benefícios trabalhistas, salariais e previdenciários, incompatíveis com o mercado e com a capacidade de geração genuína de receitas daqueles bancos. Os controles internos deficientes encontrados na maioria deles não eram, assim, mera coincidência.
Além disso, a instabilidade administrativa, decorrente da alternância dos partidos no poder, e os cerceamentos operacionais acabariam também inviabilizando a concorrência daqueles bancos com instituições privadas, que não estão sujeitas, por exemplo, à Lei de Licitações nem a regras rígidas para contratação de pessoal.
Nos tempos da inflação ainda se poderia compreender que os governos estaduais quisessem internalizar os ganhos extraordinários das instituições financeiras com o "float", embora nem isso fosse suficiente para justificar os esqueletos fiscais acumulados. Quanto ao atendimento bancário regional, a prática tem demonstrado que pode ser obtido a custos muito mais baixos, e com o benefício da transparência fiscal, utilizando-se a rede bancária privada.
A privatização dos bancos estaduais traz eficiência à alocação dos recursos escassos da sociedade, elimina a opacidade fiscal e a consequente geração de esqueletos. Contribui para o desenvolvimento econômico e para melhoria da distribuição da renda, como resultado da redução dos custos administrativos e da substituição dos critérios de compadrio pelos de eficiência, no deferimento de créditos.
Os ganhos da privatização são enormes, porém diluídos por toda a sociedade. As perdas estão concentradas em pequenos grupos, justamente os que se beneficiam com o Banespa estatal: os que pretendem realizar gastos fiscais ao arrepio do Orçamento público; os que poderiam desfrutar as vantagens do apadrinhamento político na concessão dos créditos; as próprias corporações, com seus privilégios insustentáveis; e os sindicatos de bancários. Só para ter uma idéia, o Banespa tem 312 funcionários cedidos a associações sindicais e pagos pelo próprio banco.
Já passou da hora de privatizar. Os mais de R$ 30 bilhões de rombo do Banespa foram refinanciados pelo governo federal e estão sendo pagos pelo Estado em 30 anos. As irregularidades administrativas estão sendo devidamente apuradas e as comunicações cabíveis ao Ministério Público, com indícios de crime, foram feitas.
Esperamos um leilão disputado em 20 de novembro. Entretanto, por maior que seja o ágio em relação ao preço mínimo de R$ 5,84 bilhões (R$ 1,95 bilhão para os 33,33% do capital detido pela União), a parcela recuperada será apenas uma fração do rombo.

Carlos Eduardo de Freitas, 56, economista, é diretor de Finanças Públicas e Regimes Especiais do Banco Central do Brasil.


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