São Paulo, terça-feira, 14 de novembro de 2000

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OSCAR PILAGALLO
O capital de Marta

E stá sobrando capital para Marta Suplicy. O que falta para a prefeita eleita de São Paulo é dinheiro, já que boa parte do Orçamento estará comprometida com o pagamento da dívida deixada pela gestão de Pitta e multiplicada pelos juros de FHC.
O capital do PT é a expectativa depositada em Marta. Quase seis em cada dez habitantes de São Paulo acham que seu governo será bom ou ótimo, segundo pesquisa do Datafolha.
Talvez não seja um número surpreendente, dado que a proporção é próxima do resultado do segundo turno. Ainda assim, é bom lembrar que a candidata foi beneficiada pelo voto antimalufista. Quem ao escolher Marta votou contra Maluf não teria que ter, necessariamente, expectativa positiva em relação a seu governo.
Seria ingenuidade atribuir excessiva importância a esse capital inicial. Afinal, trata-se de um voto de confiança que não costuma ser negado a governantes recém-eleitos.
Nem se está sugerindo subverter prioridades. Antes de mais nada, a prefeitura precisa de dinheiro, sem o que os programas sociais correm o risco de não sair do papel. Não é por outro motivo, aliás, que Marta já está em Washington e escolheu um banqueiro como supersecretário para cuidar das finanças municipais.
Pensar grande, no entanto, não exclui pensar pequeno. Seria um desperdício, administrativo e político, se o potencial representado pela esperança da maioria não fosse devidamente canalizado para o bem da cidade.
Em campanha e depois de eleita, reunida com representantes da sociedade civil, Marta lançou um "conto com vocês". É necessário, mas insuficiente. Para começar, a nova administração não pode subestimar o fato de que há toda uma geração que, por falta de oportunidade nos últimos oito anos, desconhece os caminhos para exercer a cidadania no nível local.
São pessoas que podem ser sensíveis a iniciativas populares, como o mutirão, palavra que tem andado sumida do léxico político. É só um exemplo.
As parcerias, outro exemplo, não precisariam ficar limitadas ao acordo com empresas. Os condomínios, que tanto gastam em reforma de fachadas e segurança, poderiam cuidar coletivamente do espaço público a um custo reduzido e enorme ganho para os moradores, que o utilizam mais do que eventuais transeuntes.
Coisas pequenas. Como adotar um jardim, zelar por uma escadaria deteriorada (como as muitas que existem no Pacaembu), limpar um terreno público. E nem precisaria haver incentivo fiscal. A simples melhora do ambiente seria mais do que recompensador aos que contribuíssem com trabalho voluntário ou dinheiro.
Esse é o capital que está à disposição de Marta. Se não for habilmente utilizado, acabará faltando -tanto quanto o dinheiro.
 
Para 2002: fica lançada a campanha contra a expressão "voto útil". Falemos, como os ingleses, "voto tático". Porque nenhum voto é inútil, certo?


Oscar Pilagallo é repórter especial da Folha e autor do livro "A Aventura do Dinheiro" (Publifolha).


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