|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CARLOS HEITOR CONY
Problemas da transição
RIO DE JANEIRO - Tenho cá minhas dúvidas sobre a eficácia da transição
que se opera toda vez que um governo substitui outro. Na rotina burocrática ela é necessária, para que os
novos governantes saibam onde estão os botões, as válvulas, os intrincados subterrâneos do Estado, que deveriam estar a cargo de um funcionalismo técnico de caráter permanente.
Dou uma comparação grosseira.
Em viagens longas, a tripulação de
um avião muda, desde o piloto, até a
comissária que ensina como atar o
cinto de segurança.
Acontece que, num avião, há um
plano de vôo elaborado anteriormente para cada aparelho e para cada rota. Pouquíssima coisa fica a critério dos novos tripulantes, eles são
obrigados a checar os instrumentos e
as condições do equipamento, sem
margem para qualquer inovação. As
próprias emergências são pautadas
anteriormente pelo fabricante e pelas
regras da aviação civil e militar.
Um país não é um avião -é evidente. Não foi feito numa fábrica, peça por peça. É um organismo vivo e
monstruosamente complicado, daí
que cada tripulação adota um plano
próprio para mantê-lo em funcionamento. Não há instruções da fábrica,
que deverão ser obedecidas mecanicamente pelos tripulantes,
Pelo contrário. Cada equipe que
substitui a anterior traça nova rota,
substitui botões e teclas, aumenta ou
diminui a velocidade e a altitude de
cruzeiro, poupa ou gasta mais combustível.
E tem mais: cada equipe governamental acredita conhecer o aparelho,
sabendo o que é melhor para voar
com segurança e chegar ao destino
traçado. Um piloto jamais poderá repetir aquele presidente da República
que, em emergência, no segundo dia
de governo, precisou se livrar de grave turbulência intestinal. Abriu uma
porta, pensando que era a do banheiro. Era o gabinete do chefe de sua Casa Militar. Pouco mais tarde, seria
deposto pelos tanques do Exército.
Texto Anterior: Brasília - Eliane Cantanhêde: Para que inimigos? Próximo Texto: Otavio Frias Filho: Mais do mesmo Índice
|