|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OTAVIO FRIAS FILHO
Mais do mesmo
Tudo o que se pode dizer, passada
a primeira quinzena após a vitória
de Lula, é que o grupo agora dominante vem administrando com prudente cautela o oceano de expectativas
que o resultado eleitoral levantou.
Exceto pelo favorecimento exagerado
na televisão -Globo e PT, tudo a
ver...- , não houve erros notáveis.
O eleito não quer se despedir da atmosfera de campanha, continuam a
aparecer apoiadores "de primeira hora", o partido se abandona ao hábito
assembleísta enquanto ainda não há o
que governar. O crédito de confiança,
que beneficia todo governo prestes a
se instalar, promete ser neste caso
maior e mais duradouro do que de
costume.
Não se trata apenas de mudança de
governo, mas de uma esperança mais
profunda, projetada sobre alguém visto como antítese de tudo o que o poder vem representando há séculos.
Vai demorar para que se perceba que
a essência de todo poder é a mesma e
que a margem de liberdade do governante é quase sempre muito estreita.
Se não há informações disponíveis,
nem vazamentos sobre nomes da futura equipe, é menos por causa da
"disciplina" petista do que pelo fato de
que o presidente eleito não começou a
agir, limitando-se a ouvir e a ponderar. Como todo ministério, este deverá
ser anunciado na última hora, depois
de uma tempestade de "lobbies" e de
balões-de-ensaio.
O combate à fome, prioridade da
qual seria difícil discordar, parece
uma satisfação às origens sociais do
eleito e uma fórmula oportuna para
desviar atenções quanto à condução
da economia. Como em tantos outros
aspectos da administração, tal prioridade deverá resultar num prosseguimento do atual programa "Comunidade Solidária" sob nova roupagem.
O "pacto social", como é clássico em
iniciativas do gênero, é o expediente
para adiar conflitos, permitindo ao futuro governo ganhar tempo até acomodá-los, enquanto transmite a sensação de que todos estão "participando". No devido momento, o governo
será compelido a atender alguns e desatender outros, quando então ninguém mais se lembrará do "pacto".
Logo mais virá o périplo ao exterior,
que todo presidente brasileiro pratica
antes de tomar posse, com vistas a assegurar repercussão na mídia nacional e eludir as pressões mais diretas na
fase em que os apetites estarão mais
aguçados, às vésperas da repartição
dos cargos governamentais.
Pelos primeiros indícios, a impressão é a de que está em montagem um
governo bastante convencional do
ponto de vista econômico-financeiro,
que vai adotar os métodos tradicionais de composição no Congresso e
que deverá demorar até adquirir alguma fluência executiva. Para quem
prometeu mudar tudo, terá sido muito barulho para quase nada.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Problemas da transição Próximo Texto: Frases
Índice
|