São Paulo, sábado, 14 de novembro de 1998

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Os cortes no Orçamento do próximo ano comprometem as áreas sociais?

NÃO
Ajuste com critérios sociais

AÉCIO NEVES

O Brasil tem visto o enorme esforço que o governo vem fazendo para enfrentar a grave crise financeira internacional, que ameaça as economias de todo o mundo. Não custa observar que nosso país em nada contribuiu para a situação de instabilidade do mercado financeiro internacional, mas não se deve deixar de ressaltar que podemos ser mais uma vítima dessa crise se medidas firmes e corajosas, como as que o governo remeteu ao Congresso, não forem adotadas.
O sistema financeiro internacional inverteu o ônus da prova em relação ao nosso país, o que significa dizer que seremos culpados por inconsistência econômica até que provemos o contrário. Perante essa injusta e inevitável circunstância, o ajuste fiscal que faremos é a prova de nossa força e da responsabilidade política do governo.
As economias sem consistência, quando se ajustam, experimentam o peso do desastre econômico (Rússia, Tailândia e, de certa forma, o México em 1994). No Brasil (assim como na Inglaterra, em 1992), as ações em questão comprovarão a robustez de nossa economia, do que resultarão -como no pequeno exemplo que já tivemos nesta semana- a queda da taxa de juros e a aceleração do crescimento.
Esse quadro enseja que o ajuste se dê sem perda do controle político, permitindo a discrição do governo sobre os rumos a adotar. As despesas da União estão concentradas na área social, no montante equivalente a 76%. Sendo essa área a mais sensível nos momentos de desaceleração do ritmo de atividade, a responsabilidade do governo fez com que o ajuste sacrificasse ao mínimo as despesas públicas. Foram cortados R$ 2,7 bilhões em relação a 1998.
Por questão de justiça social, o governo definiu que os sacrifícios serão socialmente hierarquizados. Para tanto, sustentou o movimento fiscal sobre a arrecadação e as reformas estruturais: os que podem mais pagam mais. Não se trata, portanto, de ajuste regressivo.
Sob esse princípio, a eficácia da gestão pública na área social impõe priorizar os gastos com atividades em relação àqueles com investimentos. Por exemplo, não faz sentido abandonar a prevenção da dengue em favor da construção de hospitais. Isso corresponderia a incentivar as doenças para poder acolher os doentes.
Por essa razão, as despesas em outros custeios e capital na área do Ministério da Saúde aumentarão, em 1999, em cerca de R$ 1 bilhão sobre o ano anterior. Da mesma forma, as despesas em atividades no Ministério da Educação serão acrescidas em R$ 205 milhões.
Não podemos esquecer que vivemos -isso é fato, não é retórica- uma crise econômica que ameaça o mundo como um todo e nos atingirá de forma dramática se não fizermos os ajustes necessários. Naturalmente, o momento exige sacrifícios e cortes de gastos e investimentos. Mas o governo está fazendo sua parte e agindo para cobrar mais de quem tem mais para dar.
De nossa parte, eu, como líder do PSDB na Câmara, posso assegurar que o partido está firme e coeso na decisão de aprovar as medidas do ajuste fiscal da forma mais rápida possível. Entendemos que elas, mais do que necessárias, são vitais para a preservação de nossa economia. Isso nos possibilitará, superado este momento extremamente difícil, voltar a crescer economicamente e retomar o caminho do desenvolvimento social -o que, tenho certeza, todos desejamos.
Os investimentos sociais (em saúde, educação, reforma fundiária, na Previdência, no Ministério do Trabalho e no Ministério do Planejamento e Orçamento) serão reduzidos de R$ 2,078 bilhões para R$ 1,813 bilhão. Isso corresponde a uma redução de 12,7%, perante um corte nas despesas totais de custeio e de capital (com ênfase nas não-sociais) de 19,3%.
Cortar investimentos não é do gosto de nenhum governante. Mas todo esse esforço tem um objetivo: preservar a estabilidade e, a partir dela, garantir a recuperação da economia e a geração de empregos. Esse, sim, é o maior investimento social que o governo pode fazer.


Aécio Neves, 38, economista, é deputado federal pelo PSDB-MG e líder do partido na Câmara dos Deputados.




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