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TENDÊNCIAS/DEBATES
O número de vereadores no país deve ser reduzido?
SIM
Democracia, sim; abuso, não
TIÃO VIANA
Não é de hoje que a questão institucional dos Legislativos municipais
vem provocando polêmicas na opinião
pública. A proliferação desordenada de
municípios, a partir da promulgação da
Constituição, em outubro de 1988, levou a que o Congresso Nacional adotasse o corretivo da emenda constitucional
nº 15, de 1996.
As gastanças com subsídios de vereadores levaram mais tarde à promulgação da emenda constitucional nº 25, de
2000, para que se pusesse um paradeiro
nos abusos a comprometer, cada vez
mais, as receitas municipais.
O processo eleitoral que se avizinha,
para a renovação dos prefeitos e vereadores de todo o país, já está marcado
por mais uma celeuma, provocada pela
decisão do Supremo Tribunal Federal
no recurso extraordinário nº 197.917.
Naquela oportunidade, a Suprema Corte deu provimento a apelo do Ministério
Público do Estado de São Paulo contra
dispositivo da Lei Orgânica do Município de Mira Estrela, que fixava em 11 o
número de vereadores de sua Câmara
Municipal. Mira Estrela, segundo dados
do IBGE, possui pouco menos que 3.000
habitantes.
Naquela ocasião, seguindo o princípio
da proporcionalidade, o STF adotou o
entendimento de que os municípios
têm direito a um vereador para cada
47.619 habitantes, quando situados na
faixa de até 1 milhão de habitantes. Assim, na forma da alínea a, do inciso IV,
do art. 29 da Constituição Federal, o número de vereadores de Mira Estrela deveria ser rebaixado para nove. Para municípios que possuam população entre 1
milhão e 5 milhões de habitantes, a relação de representação, consoante entendimento do STF, seria de um vereador
para 121.951 habitantes.
Temos hoje no Brasil 60.320 vereadores. Observada a tabela de proporcionalidade do Tribunal Superior Eleitoral,
em função da decisão do STF, esse número cairia para 51.252. Na hipótese de
o Senado Federal aprovar a PEC nº 7, de
1992, de autoria do ex-deputado Genebaldo Correia (PMDB-BA), o número
de vereadores subiria para 65.977. No
caso de vir a ser aprovada a PEC nº 353-A, de 2001, de autoria do deputado Augusto Nardes (PP-RS), que ora tramita
na Câmara dos Deputados, o número
de vereadores no país ficaria em 55.252.
Parece-me claro que se deve assegurar
aos municípios a autonomia para que
estabeleçam o total de componentes de
suas respectivas Câmaras. Esse imperativo decorre do art. 29 da Constituição
Federal, que, a meu ver, não pode ser alterado para que essa atribuição seja
transferida à Justiça Eleitoral, por força
da cláusula pétrea do inciso I, do par. 4º
do art. 60, já que os municípios são também entes federativos, nos termos do
art. 1º do texto constitucional.
Entretanto autonomia não se confunde com soberania. A Lei Maior, nesse
campo, estabelece um critério -o da
proporcionalidade, agora explicitado
por nossa Corte Constitucional- para
que abusos não sejam praticados.
Indo até mesmo mais adiante dos critérios adotados pelo TSE, por meio da
resolução nº 21.702, de 2004, à guisa de
uniformização do processo eleitoral
vindouro, entendo que a aplicação rigorosa da regra de proporcionalidade implicaria fixar o número de nove vereadores para as Câmaras de municípios
com até 428.571 habitantes. Melhor teria sido, inclusive, que a Assembléia Nacional Constituinte tivesse possibilitado
a democracia direta nos municípios de
menor densidade demográfica, nos
moldes dos chamados "town meetings"
norte-americanos, notadamente na Nova Inglaterra, ou dos Cantões suíços.
Mas levar à frente essa tese, no momento, só tumultuaria o processo eleitoral.
Evidentemente, seria hipocrisia de
nossa parte atribuir apenas aos Legislativos municipais as mazelas de nosso
modelo de representação parlamentar.
A prática do nepotismo, dos aumentos
de subsídios em causa própria, a reserva
de verbas para o assistencialismo de
clientela nas Assembléias Legislativas e
até mesmo no Congresso Nacional evidenciam estarmos ainda mais vinculados a um sistema oligárquico e patrimonialista do que aos fundamentos republicanos que deveriam orientar nossa
práxis política.
Ocorre que as Câmaras de Vereadores
são o tema da vez. Qualquer que seja o
desfecho, acredito que é hora de envolvermos também nossos edis em uma
discussão mais profunda, que tem uma
dimensão ética e outra política: nossos
municípios, para fazerem jus à autonomia que a Constituição lhes reconheceu,
precisam compreender que o dinheiro
dos contribuintes é precioso e deve ser
gasto de forma a otimizar os serviços
que proporcionam o bem-estar geral. E
nessa questão as Câmaras Municipais
devem dar a sua contribuição e o melhor exemplo, pois, afinal, ali se expressa a representação política mais próxima de cada um dos cidadãos brasileiros.
Tião Viana, 43, médico, é senador pelo PT-AC.
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