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CLÓVIS ROSSI
Sociedade ou impunidade
SÃO PAULO - Não estivéssemos no Brasil, seria inconcebível imaginar
que o Supremo Tribunal Federal poderia decidir contra o poder de investigação do Ministério Público, decisão que está por ser tomada.
É visível que a Constituição não autoriza expressamente o papel investigativo do MP, assim como não o veda expressamente. Trata-se, portanto,
com perdão da obviedade, de matéria de interpretação.
Interpretar contra a capacidade de
o MP investigar é decidir a favor da
impunidade e contra a sociedade.
Leguleios jurídicos à parte, está arquievidente que a polícia, que ficaria
com o monopólio das investigações,
não está em condições de fazer todas
as investigações necessárias, menos
ainda em um país de elevadíssimo
índice de criminalidade.
Basta saber que, no Estado de São
Paulo, apenas 4% dos homicídios são
de fato apurados.
Ora, se não há veto expresso, por
que então negar à sociedade um instrumento de investigação?
O argumento de que o Ministério
Público comete abusos seria risível se
não fosse, no geral, mal-intencionado. Se é esse o problema, é melhor então acabar com qualquer investigação, porque a polícia (que, repito, ficaria como o único instrumento investigativo) comete mais abusos por hora do que o MP por ano.
O próprio caso específico que está
levando à contestação do poder de
investigação dos procuradores é a
melhor demonstração do quanto isso
é necessário: em uma fraude com dinheiro público, não se discute se o
acusado é culpado ou inocente, mas
se o Ministério Público pode ou não
investigar a maracutaia.
Se não puder, incontáveis outras
continuarão impunes.
Não se trata, claramente, de uma
decisão doutrinária, conceitual, ideológica, mas de escolher entre interpretar a favor da impunidade ou a
favor da sociedade.
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