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CARLOS HEITOR CONY
Patrocínio e patrocinados
RIO DE JANEIRO - Num ano
qualquer do século 20, um faquir
com cara de indiano, mas nascido
em Quixadá, encerrou-se numa urna de vidro com cinco cobras e prometeu bater o recorde mundial de
jejum, ficando 58 dias sem nada comer. Chamava-se Silky. A marca
anterior para tal e tamanha proeza
fora de 57 dias, conquistada por um
tailandês (parece que autêntico):
morreu de indigestão quando voltou a comer normalmente.
A urna foi colocada no saguão de
um dos maiores cinemas do Rio, havia gente que passava horas fiscalizando a honestidade daquele jejum,
e quase todos despejavam, num cofre ao lado, a moeda ou a cédula de
sua admiração ou incentivo.
Não me recordo se Silky quebrou
ou não o recorde mundial. Sei que
muitas vezes ia apreciá-lo entre as
cobras, esquelético, olhos fundos,
turbante equilibrado na cabeça e
uma tanga que lhe dava o aspecto de
um mahatma em fase terminal.
Fiquei sabendo, semana passada,
que um outro faquir, natural da
Tanzânia, deseja repetir a proeza,
batendo o recorde mundial de fome, que atualmente anda na faixa
dos 92 dias.
Tem tudo pronto: a urna, as cobras que arranjou no Pantanal, a
tanga e o turbante. Mas só se submeterá à prova se obtiver patrocínio de uma estatal, de um plano de
saúde ou de um fabricante de refrigerantes. Tudo pela Lei Rouanet.
Não sou influente a ponto de clamar pelo patrocínio do novo faquir.
Sei que nada se faz, atualmente, em
termos de espetáculo ou de promoção cultural, sem o financiamento
prévio de alguma entidade benevolente, ligada de alguma forma ao governo ou a qualquer das ONGs em
atividade.
Torço para que o faquir da Tanzânia obtenha o patrocínio. Irei vê-lo,
pasmo, quando souber que ele ultrapassou a marca do seu rival indiano de Quixadá.
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