São Paulo, sábado, 15 de julho de 2006

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Novo padrão

É preciso reforçar a luta contra o prototerrorismo: a sociedade paulista deve deixar claro que não se curva à "lei" dos bandidos

A SEGUNDA onda de ataques do crime organizado em São Paulo mudou de padrão em relação à primeira série, ocorrida há dois meses. Seja porque tenha ficado mais difícil atingir as forças de segurança, seja porque os bandidos tenham entendido que semear pânico na população é tão eficaz para seus propósitos quanto atirar em policiais -e bem menos arriscado-, o foco desta vez foram missões depredatórias e espalhafatosas: ônibus e caminhões de lixo incendiados, bombas caseiras deixadas em locais públicos, agências bancárias e de veículos alvejadas.
A descrição, feita anteontem pelo comandante da Polícia Militar paulista, do perfil dos autores dos ataques se harmoniza com essa nova faceta da ação delinqüente. "Agora são adolescentes, a maioria com 20, 18 anos", disse Eliseu Eclair Teixeira. Alguns dos "comandos" foram despachados para o local do crime de bicicleta, armados com paus, galões de gasolina, coquetéis molotov. Nos ônibus, entram nos coletivos, ordenam aos passageiros que desçam e ateiam fogo.
Como já se havia prenunciado no final da primeira onda de ataques -na segunda-feira, 15 de maio, o pânico foi tamanho a ponto gerar um "toque de recolher" espontâneo a partir do final da manhã na capital paulista-, lidar com essa nova ameaça urbana requer uma mudança de atitude na própria sociedade paulista. Não é o caso de conformar-se à situação, no sentido de deixar de cobrar com cada vez mais força que as autoridades públicas dêem cabo da quadrilha que promove tais atos acintosos.
Pelo contrário, é o caso de fornecer mais um subsídio à luta contra os prototerroristas e demonstrar-lhes que a sociedade paulista não se curva à sua "lei". Foi uma pena as autoridades municipais e estaduais terem permitido que os criminosos promovessem mais um dia de "apagão" no transporte da capital. Já deveriam estar preparados para a ocasião, para garantir a saída da frota de ônibus às ruas.
"Queremos trabalhar", reivindicavam milhares de pessoas diante da ausência de transporte coletivo na manhã de anteontem, na zona sul de São Paulo. Manifesto sensato, correto, mas frustrado pela falta de previdência da gestão pública. Tanto melhor que, depois disso, uma solução à primeira vista satisfatória tenha sido encaminhada: haverá policiais vestidos em trajes civis protegendo os coletivos, de forma aleatória, mas freqüente.
Sociedades que convivem com ações intimidatórias de grupos criminosos ou terroristas aprendem rapidamente uma lição: terão sucumbido à lógica selvagem do inimigo no momento em que se permitirem uma alteração drástica de rotina motivada pelos agressores. A diferença, argüirão alguns, é que a população de alguns desses países, muitas vezes desenvolvidos, tem motivos para confiar na capacidade de reação do Estado. É verdade, mas o Brasil é uma democracia, o que significa que o destino da sociedade -incluindo a melhoria dos serviços públicos- não está nas mãos dos governantes, e sim nas da população.


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