São Paulo, quinta-feira, 15 de agosto de 2002

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O NOVO CIRO

O Ciro Gomes que participou, na terça-feira, de sabatina promovida pela Folha já não era apenas o candidato sustentado pelos periféricos PPS, PDT e PTB. A fala do ex-governador do Ceará teve de agregar novos elementos para moldar-se ao status que a sua candidatura rapidamente adquiriu na disputa pelo Planalto. Trata-se de tentar harmonizar a retórica radicalmente oposicionista do pepessista com o fato de que sua candidatura passou a sustentar-se, também, num ramo significativo da direita conservadora.
Ciro Gomes -contrastando com a branda participação de Lula no dia anterior- manteve a disposição de mostrar-se como o mais descompromissado, dentre todos os principais candidatos, com o "establishment" político, empresarial e social do país. Numa generalização descabida, o presidenciável do PPS tachou toda a "grande mídia" de governista e, portanto, contrária a seu projeto de poder; nos bancos, criticou o fato de estarem auferindo lucros extraordinários em plena crise.
Mas, se a proposta de Ciro Gomes é mudar substancialmente a condução das políticas públicas e, portanto, derrotar setores tradicionalmente privilegiados no Brasil, como explicar a adesão à candidatura da Frente Trabalhista de um oligarca como Antonio Carlos Magalhães? Como vociferar contra o que ele chama de governismo da "grande mídia" e, ao mesmo tempo, associar-se a políticos que detêm controle de meios de comunicação de massa?
A fórmula encontrada por Ciro Gomes para resolver o impasse é clássica: o exercício do poder pessoal do líder político é o elemento capaz de fazer com que essa aliança heterogênea trabalhe a favor do país. Nessa visão da política, a liderança "moral e intelectual" do presidente é fundamental para, por exemplo, convencer a oligarquia, aliada, a dobrar-se às forças da suposta modernização.
Por mais que Ciro Gomes seja estrategicamente evasivo a respeito, se ele for eleito na atual configuração, das duas uma: ou paga o preço de governar com o suporte da direita conservadora -cedendo cargos e poder político-, ou a sua Presidência tenderá a defrontar-se com impasses e turbulências constantes.



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