São Paulo, terça, 15 de setembro de 1998

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O ELEITOR E A DEMOCRACIA

O percentual de eleitores que se abstiveram de votar, anularam o voto ou votaram em branco praticamente dobrou entre a eleição presidencial de 89 e a de 94. Esse índice saltou, entre um pleito e outro, de 17,60% para 33,39%. A despeito do que possa ocorrer na eleição deste ano, há hoje a sensação difusa de que uma grande parcela da população acompanha o processo eleitoral com uma certa frieza ou indiferença, talvez inédita desde a volta da democracia.
Esse comportamento pode denotar apatia ou amadurecimento, dependendo do ângulo em que seja observado. Ele poderia ser explicado, de todo modo, por duas ordens de razões, uma própria da história política recente do Brasil, outra que leva em conta o clima político mundial.
Por um lado, parece razoável supor que a rotinização das eleições e a normalização da democracia no país tendem a diminuir o grau de expectativa diante de cada pleito. É esperado que o aprendizado do voto gere, a médio prazo, um eleitor mais cético em relação a discursos grandiloquentes e menos suscetível à demagogia, que ainda contamina fortemente a democracia brasileira. Tal fato, se pode vir a diminuir a voltagem da política, também é um sinal de realismo e de maturidade.
Some-se a isso o fato de que, no mundo todo, a política não está mais na era dos extremos. Deixou de suscitar reações apaixonadas, como as vividas no período de polarização ideológica dos anos de Guerra Fria. A falência de regimes extremistas e a própria globalização limitaram o espectro dos programas políticos.
Mas, no que diz respeito ao Brasil, país que ainda convive com índices deploráveis de miséria e que tem como um de seus maiores desafios diminuir o fosso das desigualdades sociais e regionais, a aparente indiferença diante da política é algo que inspira certa apreensão.
Muito embora a democracia esteja funcionando nas instituições brasileiras, o que é um avanço que não se deve nunca menosprezar, falta ainda um longo caminho para enraizá-la numa sociedade que, ao longo de sua história, não soube cultivar o hábito de resolver seus conflitos pela via democrática. O voto, mais que dever, é um direito, uma maneira de aprimorar a cidadania -cujo exercício ainda está longe de ser pleno.



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