São Paulo, quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

Ética e ótica

PAULO PEREIRA DA SILVA e MÁRIO HERINGER

O que se esperava colocando Carlos Lupi, um trabalhista, na função de Ministro do Trabalho? Que defendesse os interesses dos poderosos?

O MINISTRO do Trabalho e presidente do PDT, Carlos Lupi, tem sofrido implacável bombardeio da Comissão de Ética Pública da Presidência, que vê conflito de interesses no exercício dos dois cargos.
Essa posição, que não encontra amparo legal e no regimento da própria comissão, tem sido defendida ferrenhamente por seu presidente interino, o ex-ministro (do governo Collor) Marcílio Marques Moreira, que é também conselheiro de empresas privadas, algumas delas contratadas pelo governo.
Esse ex-ministro de eras não éticas agora descobriu que o ministro Lupi não pode ser também presidente de partido, ignorando o fato de que, nas melhores democracias, as parlamentaristas, o primeiro-ministro é quase sempre o presidente da agremiação que tem maioria no Parlamento!
A ética do consultor de empresas que preside a comissão baseia-se, então, no ditado "me engana que eu gosto"? Pelo raciocínio dele, Carlos Lupi pode continuar ministro desde que se licencie da presidência do PDT. Nós fingiremos então que, a partir desse momento, ele deixará de ser partidário... A mais pura das mentiras! Tudo fabricado pelos "puros de agora", estes que, sentados sobre os rabos do passado, metem-se a ditar as regras do futuro.
Senhores, o ministro Lupi foi escolhido pelo presidente Lula com apoio de toda a bancada e todo o diretório do partido. O PDT não escolheu o cargo, não indicou o nome e não pressionou o governo, pedindo o tal "ministério de porteira fechada", como alguns partidos fazem. Como se o ministério fosse uma fazenda...
O partido tão-somente concordou e deu apoio, pois estava implícito que, a partir da nomeação, estaríamos na base de apoio ao governo. Transparência absoluta. O PDT sempre se comportou assim, pois assim exigia nosso saudoso Leonel Brizola.
Pois bem: não mudamos nossa opinião e vamos agora defender esse cargo, esse nome e nossas crenças. Todos sabem que defendemos posições claras relativas ao trabalhismo, à educação, à soberania nacional, aos direitos humanos, à Previdência etc.
Não usem o subterfúgio do sofisma. Isso que querem não é ética, e sim ótica ditada pela economia. Apertem-nos pelas nossas possíveis incoerências no exercício de nossas funções. Não nos prejulguem.
O que se esperava colocando um trabalhista na função de Ministro do Trabalho? Que ele continuasse a defender os interesses dos poderosos?
Que ele se deslumbrasse com o poder? Se esperavam por isso, entendemos por que tanto querem nos tirar. E, se querem, terão que fazer pela via direta, sem malandragens.
Nós vamos, sim, exercer com clareza e transparência os nossos princípios partidários e devemos fazer isso com pessoas que pensam como nós.
Nós vamos brigar pela educação, por treinamento e qualificação profissional dos trabalhadores, sim. Nós vamos continuar combatendo esse sistema escravocrata disfarçado, sim. Vamos fortalecer o sindicalismo, sim.
Nós vamos avisar ao trabalhador que ele tem direito ao seu PIS anual, sim (não vai ficar lá engordando banco, não). Nós vamos garantir os direitos trabalhistas, sim.
Nós é que somos os modernos neste jogo... Nós é que fugimos do sistema escravocrata. Nós sabemos, e todos sabem, que estamos dispostos a discutir a modernização das relações trabalhistas e até dotá-la de ferramentas atuais.
Por exemplo: em lugar da carteira de trabalho grande e de papel, usar um cartão digital, prático e definitivo.
Ainda que isso prejudique a empresa cujos interesses o presidente da Comissão de Ética Pública representa.
Senhores, não transformem o ministro Carlos Lupi na flor do recesso -procurem outra flor para regar para não ter a dor de arrependerem-se.
Controlem-no, avaliem-no, mas não o prejulguem. E, antes de decidir, vejam como sempre foram escolhidos os ministros no Brasil e digam o que vocês sabiam do que se passava na alma de muitos deles, que, não sendo representantes partidários, não sofreram ou sofrem tal preconceito.
Preconceito, sim! De origem, de ideal, de caráter, de firmeza, de destemor, de amor ao povo brasileiro. A nossa história sempre nos colocou ao lado dos interesses do povo.
Nossas causas sempre acabaram se mostrando as melhores porque têm sintonia com a força do poder originário. Origem essa que não pode, em hipótese nenhuma, ser abusada na sua confiança por quem quer que seja.
Presidente Lula, nós estamos com o Lupi. Comissão de Ética Pública, deixe o homem trabalhar!


PAULO PEREIRA DA SILVA, 51, o Paulinho, é presidente da Força Sindical, deputado federal pelo PDT-SP e líder do bloco de esquerda (PDT, PSB, PSB e PMN) da Câmara. MÁRIO HERINGER , 53, médico e administrador hospitalar, é deputado federal pelo PDT-MG.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

Texto Anterior: Frases

Próximo Texto: João Paulo Campi: Parcerias nos serviços de saúde

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.