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TENDÊNCIAS/DEBATES
NÃO
Decisões econômicas, premissas políticas
ALEXANDRE JORGE CHAIA
A
PESAR DO esforço do governo
em buscar uma equação que
possa solucionar a possível
transferência significativa de recursos dos fundos de investimento para
aplicações em caderneta de poupança, me parece que a proposta apresentada no último dia 13 pelo ministro
Guido Mantega (Fazenda) não contemplou a real causa do problema.
A questão central da migração de
recursos está relacionada às taxas de
administração cobrada pelos fundos
de investimentos em renda fixa, que
oscilam entre 0,5% a 4,5% ao ano.
Tomando como exemplo um fundo
que cobra 2,5%, o retorno bruto, caso
a taxa de juros básica seja 10,5% ao
ano, é de 8%. Considerando ainda o
imposto de renda de 1,2%, calculado
aplicando a alíquota de 15% sobre o
ganho bruto, chegamos a um retorno
líquido de 6,8% ao ano. Como esse
rendimento é superior ao da caderneta de poupança, que rende aproximadamente 6,5% ao ano, a decisão do investidor será manter suas aplicações
em fundos. Caso a taxa de juros básica
seja menor que 10%, o retorno da caderneta de poupança passará a ser
mais atrativo que o dos fundos.
A decisão do governo para evitar a
migração foi tributar os investidores
que possuem recursos superiores a
R$ 50 mil, não penalizando os pequenos poupadores. Porém, a decisão incorreta do governo está no fato de assumir que pequenos e grandes investidores pagam a mesma taxa de administração. Aos grandes investidores
as instituições financeiras oferecem,
naturalmente, taxas de administração mais competitivas. Por isso, não
há motivos para que esses investidores migrem suas aplicações para a
poupança enquanto a taxa de juros
básica estiver acima de 8,5%.
Por outro lado, os investidores que
possuem recursos abaixo de R$ 50
mil e que têm menor poder de negociação com as instituições financeiras
serão mais propensos a transferir
seus recursos, e a proposta de tributação do governo para as cadernetas de
poupança será inócua.
Essa questão torna-se ainda mais
relevante porque a maior parte do volume em fundo de renda fixa está concentrada na mão desses aplicadores.
A partir dessa análise, poderá haver
duas grandes consequências para a
economia brasileira: um possível aumento do custo de financiamento da
dívida pública, com perda de capacidade de investimento do governo, e a
criação de uma bolha de crédito imobiliário no mercado nacional, nos
moldes da que deu início à atual crise
financeira internacional.
A elevação do custo de financiamento da dívida pública ocorrerá
porque são os fundos de investimento
em renda fixa que normalmente adquirem grande parte dos títulos emitidos pelo governo. Como os recursos
da caderneta de poupança são obrigatoriamente destinados ao financiamento imobiliário, o Tesouro nacional perderá o seu melhor "cliente".
Com menos clientes, o governo terá
que elevar o ganho oferecido na venda de novos títulos, reduzindo o benefício da queda da taxa básica no pagamento de juros da dívida pública.
Quanto à bolha de crédito imobiliário, devido à regra de aplicação de
65% dos recursos da caderneta de
poupança em financiamentos habitacionais, haverá um aumento do volume de dinheiro disponível, que obrigatoriamente deverá ser destinado à
concessão de novos financiamentos.
Como atualmente a economia não
está em momento de forte expansão,
esses recursos adicionais forçarão as
instituições financeiras a diminuir as
exigências necessárias para os novos
mutuários, criando um ambiente
propício a uma maior inadimplência
no médio prazo.
Para resolver definit
ivamente o
problema, o governo deveria estabelecer as mesmas condições para todas
as opções de investimento, incluindo
a mesma alíquota de tributação tanto
para aplicações em poupança quanto
para os fundos de investimento. Mas
essa medida apresenta um caráter negativo do ponto de vista político, pois
parece que o governo está tributando
as pessoas de menor poder aquisitivo.
Mais uma vez, o governo adia a situação, esperando que algum milagre
possa solucionar os problemas.
ALEXANDRE JORGE CHAIA, 42, economista, mestre em
administração pela USP, é professor de derivativos e risco
do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa).
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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