São Paulo, domingo, 16 de junho de 2002

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BRASIL EM DÚVIDA

No início do Plano Real, o ministro da Fazenda, Pedro Malan, insistia em praticamente todos os seus pronunciamentos nas dificuldades de consolidação da estabilidade de preços. Não bastaria o artifício, recorrentemente utilizado nos planos anteriores, da troca de moeda. Seria preciso mudar o país a fim de moldar uma cultura antiinflacionária. Pouco menos de uma década depois, as dúvidas sobre a consistência da estabilidade brasileira são ainda significativas. A rápida deterioração dos indicadores econômicos e das expectativas financeiras no país e no exterior é o maior indício da fina superfície sobre a qual patinam as autoridades econômicas.
Tamanha fragilidade não se deve à suposta cultura inflacionária da sociedade brasileira, mas à inconsistência da política econômica conduzida ao longo dos últimos anos.
Seja quem for o próximo presidente, ele não poderá seguir adiante sem um período inicial -que pode ser longo, de um a dois anos- em que será preciso colocar ordem na casa. Ordem que não se resume a diretrizes macroeconômicas genéricas como "respeito a contratos" e "prioridade ao crescimento e aos setores produtivos". Os ajustes necessários dependem sobretudo de medidas setoriais e microeconômicas. Muitas delas, reclamadas há anos por lideranças empresariais e políticas, jamais entraram na agenda do governo Fernando Henrique Cardoso.
Para resguardar a estabilidade de preços e recuperar a possibilidade de alongar a dívida pública, diminuindo também o seu custo para a sociedade, são necessárias medidas de ajuste no sistema previdenciário, cuja insustentabilidade há anos vem sendo apontada por especialistas os mais diversos. A reforma nesse campo ficou incompleta.
O mesmo vale para a reforma tributária. Seja quem for o presidente eleito, poderá dispor de força política no início de seu mandato para buscar a repactuação federativa, a superação da guerra fiscal, a eliminação de impostos que incidem em cascata e prejudicam os setores produtivos e exportadores e a promoção de equidade distributiva. Sobre esses temas, os partidos e os pré-candidatos ao Planalto pouco -e mal- têm se manifestado, ao menos em público.
É também preocupante a ausência de propostas voltadas ao equilíbrio das contas externas. Não há como levar adiante a política de estabilização se não se organizarem melhor as políticas comercial e industrial, dando consistência a um projeto de desenvolvimento competitivo que seja a base de superávits comerciais e investimentos estrangeiros sustentáveis. Fala-se em substituir importações e em promover exportações. Não basta. É preciso definir os setores prioritários e trazer à luz do dia questões como prazos e custos fiscais desse possível favorecimento.
Em resumo, os horizontes ficariam mais claros se se soubesse em que termos os candidatos a presidente pretendem fazer o que o presidente Fernando Henrique Cardoso e o ministro Pedro Malan não conseguiram realizar em quase oito anos.



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