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São Paulo, segunda-feira, 16 de junho de 2003

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BORIS FAUSTO

Beco sem saída

Quais as possibilidades de que tenha êxito o plano de paz proposto pelos Estados Unidos mais a ONU, a UE e a Rússia para resolver o confronto entre israelenses e palestinos?
A resposta só pode ser pessimista, não tanto pelo fato de que o plano represente uma quase reprodução das fracassadas tentativas anteriores e deixe no ar as questões mais delicadas, mas simplesmente porque mesmo seus primeiros passos parecem ser inviáveis. Isso se deve aos limites de ação das partes envolvidas, à sua insinceridade ou à sua ilegitimidade, conforme o caso.
O papel do governo Bush, para começar, é uma novidade contraditória. A guerra do Iraque demonstrou a força militar arrasadora dos Estados Unidos. Porém, ao mesmo tempo, introduziu no mundo árabe inquietações sobre o novo desenho do mundo, traçado sem disfarces pela Casa Branca. Além disso, Bush vê-se limitado internamente tanto pelo lobby judaico como por seus amigos da extrema direita fundamentalista, ligados a Israel, como parte de sua mitologia teológica.
Olhando as forças diretamente envolvidas, o pessimismo cresce. Concebido como um processo que se estenderia ao longo dos anos, o caminho da paz pressupõe medidas que o governo de Ariel Sharon não pretende nem pode tomar. Exemplificando: o objetivo último de constituição de um Estado palestino independente, com fronteiras estáveis e espacial e economicamente viável, passa pelo gradativo desmantelamento das colônias estabelecidas em território palestino.
Sharon teria de deixar de ser Sharon para empreender essa complicada tarefa, que envolve em torno de 200 mil colonos na Cisjordânia e em Gaza. Mesmo que se transfigurasse, acabaria sendo liquidado por seu próprio partido (Likud) e pela extrema direita religiosa ou laica. Convém lembrar, de passagem, que os trabalhistas, caso algum dia cheguem ao poder, não se comportariam de forma muito diferente -pelo menos com a sua atual direção.
Do outro lado, a escolha do moderado Abu Mazen para o cargo de primeiro-ministro do governo palestino não suscita maiores esperanças. O problema, nesse caso, não parece ser a ausência de disposição a um real entendimento, mas a falta de representatividade do ministro, sabotado por Iasser Arafat -que espera ressurgir na crise- e ridicularizado pelas costumeiras grosserias e bravatas de Sharon.
A precária posição de Abu Mazen ficou demonstrada nos dias que correm pelo fracasso da tentativa de incluir as organizações de luta armada nas negociações de paz, resultando no círculo infernal de atentados e de retaliações, hoje em uma nova e mais grave etapa. De resto, se as organizações terroristas são responsáveis por inúmeras ações sangrentas, é certo também que o comportamento de sucessivos governos israelenses dá argumentos e lastro social para essas ações.
Um fosso se aprofundou entre os dois povos sem que haja perspectiva de mudança no quadro. No seu simbolismo, o extenso muro segregador, feito de concreto, que Israel está construindo na Cisjordânia revela quão distante estamos de uma paz baseada na boa-fé recíproca e no entendimento.


Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.


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