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MARCOS NOBRE
Indústria cultural
O TEÓRICO SOCIAL Theodor
W. Adorno (1903-1969) voltou à cena nos combates
culturais das últimas semanas.
Principalmente por ter criado o
termo "indústria cultural" para circunscrever o lugar da arte e da cultura no capitalismo altamente desenvolvido do século 20.
As referências a Adorno no debate cultural não costumam ser lisonjeiras. Ele é caracterizado como
elitista, hermético e superado. Um
mal-humorado incorrigível que
não gostava de jazz.
Ridicularizar uma figura como
Adorno é mais fácil do que discutir
a sério as relações entre capitalismo e cultura. Mais fácil do que explicar por que um conceito criado
há mais de 60 anos continua a ser
o ponto de partida do debate até
hoje.
A idéia é simples como toda boa
idéia. Com o desenvolvimento do
capitalismo, também a arte passa a
ser cada vez mais regida por princípios de mercado. Em um sentido
bem preciso: o formato mercadoria
passa a determinar a própria forma
de produção da arte.
A idéia fundamental é a de que
há padrões, "standards" de produção da arte que têm de ser respeitados se quem produz arte quiser ter
sucesso. E isso quer dizer: se quiser
vender seu produto no mercado.
O resultado é conformista. A arte
se torna um tipo de tranqüilizante
contra as dores do cotidiano.
Para combater esse resultado,
Adorno dava como exemplo a arte
que não é produzida segundo esses
padrões impostos previamente pelo mercado. E mostrou que havia
uma recepção dessa arte que reproduzia a mesma atitude crítica
do momento da criação da obra.
Mas isso não basta. Quem não
quer abrir mão de uma posição crítica como a defendida por Adorno
se obriga a investigar com cuidado
o funcionamento concreto do mercado cultural. Para conseguir
captar o sentido de suas transformações.
Foi só nos últimos meses de sua
vida que Adorno percebeu que mudanças importantes estavam acontecendo em relação ao diagnóstico
que tinha feito na década de 1940.
Mas não chegou a analisar em profundidade indicações de que uma
atitude crítica na recepção dos produtos da indústria cultural estava
surgindo.
Também não chegou a ter clareza de que a expansão e a diversificação do mercado abriam brechas
significativas de resistência e de
contestação. Muito menos chegou
a ver que novas formas de produção artística questionavam o
mercado de dentro, politizando a
vida cotidiana com uma amplitude
inédita.
Apontar a insuficiência das análises de Adorno para o momento
presente é certamente essencial.
Mas não se confunde com o conformismo de jogar fora Adorno
com a água da crítica.
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta
coluna.
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