São Paulo, terça-feira, 17 de fevereiro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Cumprimos o nosso papel

JOÃO PAULO CUNHA

Entre os dias 19 de janeiro e 14 de fevereiro, a Câmara dos Deputados respondeu à convocação extraordinária que lhe fez o presidente da República. Mais que isso: cumpriu-a com responsabilidade e determinação. Embora contrários à iniciativa, pois entendíamos que o exame das matérias propostas aconteceria ao longo da sessão legislativa que iniciamos nesta semana, nós, os deputados, desempenhamos o papel que nos cabe. Fomos, nesse mês, como não deixamos de ser em 2003, o foro em que se discutiram as questões maiores da sociedade. Foram 25 dias corridos de convocação extraordinária. Nesse período, realizamos 29 sessões e aprovamos 22 matérias.
Mais do que uma avaliação quantitativa, devemos reconhecer a importância qualitativa dessas matérias. Votamos, por exemplo, as medidas provisórias do setor elétrico. Elas modificam as regras de comercialização da energia e criam a Empresa de Pesquisa Energética. Com isso, estima-se a captação de mais de R$ 10 bilhões para investimentos no setor. Esses recursos estimularão a economia e assegurarão o crescimento da indústria nacional. Aprovamos, também, o projeto da Lei de Biossegurança. Ele dá diretrizes e normatiza a pesquisa científica, a segurança, a comercialização e a fiscalização de organismos geneticamente modificados. Essa questão, polêmica, é das mais relevantes para o desenvolvimento econômico e para o futuro da humanidade.


Mais do que no cotidiano das pessoas, é na política que a pressa se comprova inimiga da perfeição


Outro importante projeto aprovado é o que trata do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas. Com a proposta, que irá para exame do Senado, o Brasil disporá de uma das melhores, mais modernas e mais eficientes legislações do mundo no setor. Ao mesmo tempo em que os traficantes serão submetidos a penas maiores e mais rigorosas, os usuários de drogas receberão tratamento médico diferenciado e penas alternativas.
A aprovação da constitucionalidade de duas propostas de emenda à Constituição -a chamada PEC paralela da Previdência e a da reforma tributária- demostra o esforço da Câmara dos Deputados por um novo Brasil -economicamente mais próspero e socialmente mais justo. A propósito, é preciso reconhecer o notável desempenho das comissões da Casa no decorrer da convocação extraordinária, sobretudo o da Comissão de Constituição e Justiça e de Redação. Por ela tramitaram, além das PECs já referidas, as que dispõem sobre o trabalho escravo e sobre a federalização de crimes contra os direitos humanos.
Trabalhamos ainda, nesse mês de convocação extraordinária, nas comissões temporárias especiais: a que tem por objeto apurar a crise da Parmalat, a da promoção social da mulher, a da morte dos auditores-fiscais do Trabalho em Unaí e a que apura a prisão dos imigrantes brasileiros nos Estados Unidos. Às disputas partidárias e às conveniências políticas devem sobrepor-se, sempre, o interesse coletivo, o bem comum e a prevalência da cidadania. Mais do que no cotidiano das pessoas, é na política que a pressa se comprova inimiga da perfeição. Votadas em comissão, as matérias em curso haverão de tramitar com a rapidez e a agilidade que lhes são devidas.
Uma injustiça, porém, incomodou-me nesse período. E ela foi perpetrada pela imprensa. Aos jornais, às emissoras de rádio, de televisão e ao chamado jornalismo eletrônico cumpre não só denunciar o erro, estampar o mal, condenar o crime. Cabe, igualmente, enaltecer o bem, publicar o acerto, divulgar o correto. Na vida pública, por mais que se faça, haverá sempre outro tanto a fazer. Cobre-se o que se deve, ao país e ao povo, reconhecendo, porém, o trabalho, o esforço e a luta dos que se desdobram para, honestamente, desincumbir-se dos deveres que lhes pesam aos ombros, como cidadãos e como homens públicos. Digo isso porque, a despeito de a Câmara dos Deputados ser hoje a mais transparente instituição pública brasileira, a única que expõe na internet todos os seus contratos internos e processos legislativos e administrativos, jamais assiste ao louvor público de suas virtudes, mas apenas à exposição pública de desacertos cometidos por uma minoria.
Em 2003, demos um grande passo no gigantesco projeto de construção de um Brasil melhor, mais próspero e mais digno. Essa luta foi travada em nome da economia: controlou-se a inflação, administraram-se as relações de câmbio e não houve prejuízos com a balança comercial. Em 2004, espero, essas vitórias econômicas serão postas em favor da promoção social, do desenvolvimento humano, de uma condição mais próspera, mais digna e mais justa para todos os brasileiros. Confirmado o bom desempenho da economia, é fazê-la, agora, gerar emprego e renda, saúde e habitação, educação e cultura, saneamento básico e segurança pública. Que esses privilégios de poucos se tornem direitos de todos, para que deixemos de ser uma nação desigual, injusta e indigna do seu grande povo. A Câmara, mais uma vez, cumprirá o seu papel.

João Paulo Cunha, 45, deputado federal pelo PT-SP, é o presidente da Câmara dos Deputados.


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