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Acordo razoável
Brasil e Bolívia fecham acordo sobre o preço do gás natural e abrem perspectivas para novos investimentos
AS NEGOCIAÇÕES entre o
governo brasileiro e o
boliviano culminaram
em um aditivo ao contrato de compra e venda de gás,
em vigor até 2019. Sem alterar o
valor do combustível, a composição química do produto ensejou
um pagamento adicional. O preço do combustível foi mantido
em US$ 4,20/milhão de BTUs
(British Termal Unit, medida internacional de energia), mas se
pactuou um bônus pelo alto teor
energético do gás fornecido pelos campos bolivianos.
O gás boliviano adquirido pelo
Brasil possui teor médio de
9.400 kcal/m3. Todo o volume
que exceder a 8.900 kcal/m3 (o
padrão global) será remunerado
de acordo com cotações internacionais. Estima-se que o preço
final subirá para a faixa de US$
4,33 a US$ 4,54 (de 3,1% até 8%
de aumento). Trata-se de tarifa
menor do que a paga pela Argentina (US$ 5), que compra menos
gás (7,7 milhões de BTUs/dia,
ante 26 milhões do Brasil).
Outra negociação girou em
torno do suprimento para a termelétrica de Cuiabá (MT). Nesse
contrato, os preços foram reajustados de US$ 1,19, muito abaixo das cotações internacionais,
para os mesmos US$ 4,20. O impacto nas tarifas domésticas da
eletricidade será diluído nacionalmente.
A alteração no preço e na forma de comercialização exigirá
um avanço tecnológico da Petrobras. Abre-se para a estatal a
oportunidade de desenvolver
projetos a fim de separar as parcelas nobres do gás -e vendê-las
a preços mais altos-, o que diminuiria o impacto da majoração
para o consumidor brasileiro.
Diante dessa perspectiva, retomaram-se as negociações para
viabilizar o Pólo Gás Químico,
idealizado pela empresa brasileira Braskem na fronteira entre os
dois países. O projeto visa a usar
o etano do gás da Bolívia para a
produção de polietileno, uma
das resinas do plástico.
Foi negociada ainda a instalação de uma usina de biodiesel no
território boliviano. O investimento seria realizado pela Petrobras em parceria com um
grupo local, privado ou estatal.
Além de afastar o risco de interrupção no fornecimento, os
acordos são favoráveis aos dois
países. Por um lado, remunera-se um pouco mais o produto boliviano, sem grandes impactos
para o consumidor doméstico.
Por outro, abrem-se novas oportunidades de investimento.
A consecução desses objetivos,
no entanto, ainda depende de
uma atitude mais firme do governo Morales na defesa dos investimentos externos realizados
em seu território. O Brasil ganha
condição renovada de cobrar tal
compromisso de La Paz, trunfo
que precisa ser exercido em sua
plenitude pelo governo Lula.
A nota negativa do acordo foi a
declaração do presidente brasileiro de que agia movido por "generosidade" ao aceitar o aumento no preço do gás. Quem faz diplomacia por generosidade sempre concede mais do que o interesse nacional recomendaria.
A análise fria dos números do
acordo com a Bolívia não favorece essa interpretação. Mas todo
o episódio revela que a retórica
diplomática do Brasil ainda precisa ser mais bem ajustada ao interesse nacional -que, numa
economia globalizada, cada vez
mais se justapõe ao interesse das
empresas brasileiras.
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