São Paulo, sábado, 17 de setembro de 2011

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Há ministérios em excesso no Brasil?

NÃO

Há ambição de menos, não ministros demais

ROBERTO LUIS TROSTER

A dúvida que aflige os brasileiros não gira em torno da quantidade de ministros, mas sim do que vai acontecer na economia no futuro próximo. O cenário externo é de volatilidade, crescimento baixo e incertezas que aumentam a cada dia. Internamente, o quadro é dissonante.
De um lado, multiplicam-se perspectivas positivas em razão do potencial do país; de outro, acumulam-se indicadores e indefinições que preocupam.
Para ilustrar o ponto: o país tem um superavit comercial de US$ 16 bilhões, mas gasta mais do que isso na política de reservas e em viagens internacionais. O turista brasileiro é o terceiro maior gastador em passeios aos Estados Unidos. Na prática, se estão trocando exportações de minério de ferro e soja por bugigangas chinesas em Miami. Faz sentido? É sustentável? Que ministério é responsável por corrigir essas distorções?
Há uma preocupação com a construção dos estádios para a Copa de 2014; as ações dos diferentes envolvidos estão sendo coordenadas para seguir um cronograma.
Mas, para todo o resto, o que está sendo feito? Cada ministério parece ter uma agenda própria.
Para dar um exemplo, quais são os órgãos responsáveis por evitar os estragos que acompanham as chuvas da virada do ano, para que não se repita o que Santa Catarina vive agora?
Em outra frente, anuncia-se o consumo para enfrentar a crise. Por que então esse aperto no crédito? O governo vai aumentar o superavit fiscal, mas não cortará investimentos nem gastos sociais. De onde virá a economia, pois?
A pergunta mais importante é: qual é o papel de cada ministério?
As condições para crescer aqui são boas, mas faltam definições para que cada um cumpra sua parte.
Num cenário internacional atravessado por turbulências, resta saber como nos blindar da instabilidade. Há três mecanismos que propagam uma crise externa. O primeiro é o comercial -cuja inércia deve impedir mudanças no curto prazo.
Outro é o financeiro: certamente haverá volatilidade nas bolsas, mas a oscilação afeta mais os especuladores do que os trabalhadores.
O terceiro é o das expectativas, certamente o mais potente no que tange à destruição de riquezas. É ele que imobiliza ministros e empresários. Faz com que decisões de investimento e de consumo sejam postergadas e com que o crescimento despenque.
O que o Brasil necessita é de um diagnóstico equilibrado que diminua as incertezas e a possibilidade de tomada de decisões equivocadas. Anunciar que o país está forte é pouco. Falta um plano estratégico.
Debate-se se o país vai crescer 3,5% ou 3,7% neste ano, o que é irrelevante diante da análise de qual será a velocidade de cruzeiro da economia após as turbulências (4% ou 8%?). Outras nações com potenciais inferiores conseguem mais. Por que não fazer melhor do que elas?
Falta uma análise objetiva de quais são os pontos fortes, fraquezas, oportunidades e ameaças à economia brasileira, além de projetos de reformas tributária, previdenciária, setoriais, trabalhista e empresarial a vigorar a partir de 2021. Quais serão os propulsores da economia nos próximos anos?
Falta a partitura com a música do país para a próxima década. A partir dela, pode-se definir o número de músicos, digo, ministros, e o papel de cada um. Até lá, tanto faz se temos 38, 18 ou 58. O Brasil não tem ministérios demais, mas ambição de menos.

ROBERTO LUIS TROSTER, doutor em economia pela USP, foi economista-chefe da Febraban, da ABBC e do Banco Itamarati e professor da USP, PUC-SP e Mackenzie.

E-mail: robertotroster@uol.com.br

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