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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES
80 anos em prol da democracia
John Stuart Mill, em 1859, sonhava com o dia em que a imprensa livre pudesse se tornar a grande arma para combater os governos corruptos e tirânicos. Em 1900, o seu sonho ainda não havia sido realizado.
Na verdade, a liberdade de imprensa
é uma conquista relativamente nova.
Uma pesquisa recente, que classificou
a imprensa como livre, parcialmente
livre e amarrada, registrou só 68 nações no primeiro grupo, 52 no segundo e 66 no terceiro. Apenas 1,2 bilhão
de pessoas vivem no mundo da imprensa livre; 2,4 bilhões conhecem a
imprensa parcialmente livre; e mais
de 2,5 bilhões não têm a menor idéia
do que seja a liberdade de expressão
(Leonard R. Sussman, "The News of
the Century", 1999).
O Brasil, felizmente, está no primeiro grupo. Mas os brasileiros, especialmente os mais jovens, acham que a liberdade que temos veio como dádiva
de governantes generosos e compreensíveis.
Nada disso. A conquista da liberdade de imprensa constitui um dos capítulos mais árduos na nossa história.
Ao longo do século 20, o país viveu
mais anos de autoritarismo do que de
democracia. A travessia de um regime
para outro foi realizada a duras penas
e grandemente baseada no denodo de
jornalistas corajosos, deliberados e
profundamente comprometidos com
a causa democrática. A liberdade é como a saúde: só a valorizamos quando
a perdemos.
Um jornal como a Folha de S.Paulo,
que completa 80 anos, sentiu na pele o
que era viver subjugado e, sem se acomodar, lutou com todas as suas forças
para libertar o povo da mordaça da
censura, da intervenção e do arbítrio.
Na verdade, essa luta tem raízes profundas. Já no ano de sua fundação
(1921), a então "Folha da Noite" lançou a campanha pelo voto secreto; em
1931, foram as longas campanhas pela
saúde pública; em 1945, foi desfraldada a bandeira pela cédula única; durante toda a década de 70, foi a luta
pela redemocratização; em meados
dos anos 80, foi a liderança da Folha
de S.Paulo na importante campanha
pelas Diretas-Já; em 1993, foi o esclarecimento do povo a respeito do plebiscito, parlamentarismo ou presidencialismo. E daí para a frente a luta
constante pela moralidade pública.
Hoje nos queixamos da corrupção
que ainda impera no país. Mas é a imprensa livre que nos faz saber disso.
Lamentamos as negociatas que são
feitas no mundo da política. Mas é a
imprensa livre que permite julgar os
negociantes para negarmos o nosso
voto. Odiamos quando se usurpam os
direitos dos consumidores, trabalhadores, produtores e cidadãos em geral. Mas é a imprensa livre que orienta
a população em relação aos usurpadores.
Podemos discordar da maneira pela
qual esse ou aquele veículo se comporta. Mas ninguém subestima o valor da liberdade que prospera em nossa imprensa. Os abusos existem, é verdade, mas são para ser discutidos. A
moderação é necessária, mas é para
ser apreendida. A temperança é útil,
mas só surge com o tempo. É essa figura equilibrada de Octavio Frias de
Oliveira, cuja vida podia ser de aposentado, que reúne em uma só pessoa
a moderação e a temperança que tanto contribuem para conter os abusos e
manter a imprensa livre. Um grande
exemplo para todo o Brasil.
Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.
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