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TENDÊNCIAS/DEBATES
As finanças de São Paulo
JOÃO SAYAD
Dois anos atrás, a situação financeira da cidade de São Paulo era a
seguinte: R$ 4 bilhões em precatórios
atrasados, mais R$ 4 bilhões em esqueletos, 13% da receita comprometida
com o acordo com a União, atrasos de
pagamento de até dez meses, disponibilidade de caixa para três dias de dispêndio, contratos de emergência em toda a
administração, desperdício em contratos superfaturados, calote nas concessionárias de serviço público, guerra fiscal no ISS em toda a região metropolitana, atraso tecnológico na fiscalização,
execução orçamentária (ainda usavam
computadores 486), ausência completa
de fiscalização eletrônica de contribuintes e sistema tributário socialmente injusto e juridicamente questionável. Tudo isso na cidade de São Paulo, onde o
número de desempregados havia aumentado em 1 milhão nos últimos oito
anos.
No ano passado, conseguimos colocar
os pagamentos em dia, renegociar os
atrasados com os sindicatos de fornecedores, renegociar quase todos os contratos, com economia de cerca de R$ 1
bilhão, aumentar a disponibilidade de
caixa para 45 dias de dispêndio (o que
gera uma receita adicional de aplicação
financeira de cerca de R$ 400 milhões
em quatro anos), retomar o pagamento
dos precatórios, retomar o pagamento
das concessionárias (não se pagava iluminação pública havia cinco anos), honrar o acordo com a União, promover
as licitações e iniciar a reforma tributária, começando pelos tributos imobiliários (IPTU e ITBI).
No caso do IPTU, foi introduzido,
com amparo constitucional, o princípio
da progressividade, o que permitiu
isentar cerca de 1 milhão de contribuintes e reduzir a alíquota para outros 800
mil, além da isenção de ITBI (Imposto
de Transmissão de Bens Imóveis) para
imóveis residenciais de até R$ 30 mil.
O orçamento das empresas municipais, que era de R$ 1,2 bilhão em 1999,
passou a ser de R$ 500 milhões em 2003.
Houve também economias expressivas
na limpeza urbana, no Leve Leite, em
aluguéis (contribuiu para esse caso a
mudança de algumas secretarias para o
centro), em vigilância, em limpeza de
interiores etc.
No segundo ano da atual administração, era necessário ir além -tratava-se
de recuperar a capacidade de investimento da cidade para enfrentar velhos e
novos problemas: a ampliação da rede
de iluminação pública, o déficit de vagas
nas escolas e creches, a evasão escolar
(programa de construção de 45 Centros
Educacionais Unificados, que abrem
grandes clareiras de espaço público na
periferia congestionada da cidade, com
teatro, centro esportivo, biblioteca e salas de aula, além de mais cem escolas, do
programa de renda mínima para 182
mil famílias, do transporte escolar, do
material, do uniforme, da merenda de
qualidade etc.), implementação do Programa Saúde da Família (PSF), a construção de novos aterros sanitários (já
que os atuais têm vida útil de cinco
anos), a melhoria das condições da malha viária para a implantação do novo
sistema de transporte, além de retomar
ou aprofundar os programas de habitação, de combate à exclusão (Bolsa-Trabalho, Começar de Novo etc.), de combate a enchentes (novos piscinões), de
desenvolvimento local (Banco do Povo
e Economia Solidária), de segurança, de
cultura e de esportes.
A atual administração entregará a cidade com um ajuste duradouro nas
receitas municipais e com mais justiça social
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Na área tributária, tivemos grande vitória na questão do combate à sonegação disfarçada como guerra fiscal.
Aprovamos emenda constitucional que
estabelece alíquota mínima de ISS de
2% no território nacional; aprovamos,
na Câmara dos Deputados, lei complementar que dirime finalmente as disputas judiciais sobre o local do recolhimento do tributo, cabendo ao Senado
sacramentá-la; aprovamos lei municipal que diminui a alíquota de vários serviços, entre os quais, saúde, educação e
habitação popular. Introduzimos a Declaração Eletrônica de Serviços (DES),
que obriga qualquer empresa instalada
em São Paulo a declarar, via internet, todos os serviços prestados e/ou tomados
na cidade, o que permitirá, pela primeira vez, a ação fiscalizadora eletrônica inteligente.
Substituímos a TLIF, considerada inconstitucional, pela TFE (incorporando
os serviços de vigilância sanitária, finalmente municipalizados). Instituímos a
Cosip (que vai garantir, em primeiro lugar, o pagamento, que não era feito, dos
serviços de iluminação pública e, em segundo lugar, a ampliação e melhoria da
rede) e a taxa do lixo (que permitirá a licitação da concessão do serviço de coleta de lixo).
São Paulo será a única cidade do país
que cobrará pelo lixo efetivamente produzido pela unidade geradora (sistema
de autodeclaração, inédito no país), sem
se valer de critérios como metro quadrado de área construída ou metro cúbico de água consumida, como se faz
habitualmente em outros municípios.
Essa sistemática, própria de países desenvolvidos, permitirá que, num futuro
próximo, o contribuinte que aderir à coleta seletiva tenha o benefício da isenção
ou da redução da taxa. Essa taxa tem o
valor de R$ 6 por mês para a maioria
dos contribuintes residenciais da cidade, valor menor do que o pedágio pago
para uma viagem de fim de semana a
Santos e igual à tarifa bancária do licenciamento de veículos.
Além disso, cobrar o serviço do lixo
significa economia de impostos pagos
pelos paulistanos, pois, para pagar R$ 1
de despesa de lixo, precisamos de R$ 4
de impostos gerais como o IPTU e o ISS
-afinal, os recursos desses impostos
são gastos, por força da Constituição,
com educação, saúde e pagamento da
divida.
Apesar disso, em 2003, o orçamento
per capita continua menor do que o de
outros municípios, como Rio de Janeiro, Porto Alegre e Salvador. Contudo a
atual administração entregará a cidade
com um ajuste duradouro nas receitas e
nas despesas municipais, sem desprezo
pela questão da justiça social e tributária. Hoje, em São Paulo, há um número
maior de cidadãos que pagam menos
tributos do que cidadãos que pagam
mais, e os recursos foram direcionados
para os que mais necessitam, tanto do
ponto de vista do custeio como do investimento.
João Sayad, 57, doutor em economia pela Universidade de Yale (EUA), é secretário de Finanças
e Desenvolvimento da Prefeitura de São Paulo.
Foi ministro do Planejamento (governo Sarney).
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