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São Paulo, terça-feira, 18 de fevereiro de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O jovem no mercado de trabalho

GUILHERME AFIF DOMINGOS

Agora que o presidente Lula assume o comando da nação, venho cumprimentá-lo não só pela eleição mas também pela coerência demonstrada na proposta feita em Davos, na Suíça, de equilibrar austeridade fiscal com ação social. Sabemos o quão difícil é a missão, principalmente na hora de transformar intenções em ações.
No momento em que o governo federal está prestes a lançar o programa do primeiro emprego para jovens, é importante que o presidente e seus ministros conheçam o que a sociedade organizada já está fazendo no setor. Não temos tempo, no Brasil, para reinventar a roda. Temos 8 milhões de jovens que vivem em famílias com renda mensal de até 0,5 salário mínimo e com ao menos quatro anos de defasagem escolar.
A situação atual é extremamente delicada. Nunca tivemos em nossa história um contingente tão grande de adolescentes como neste momento. E eles estão chegando ao mercado de trabalho no exato momento em que este se encolhe. O resultado é desastroso, como todos sabemos.
Indicadores apontam 50% de desemprego na faixa de 14 a 18 anos. Se o mercado formal de trabalho não os absorve, eles buscam guarida no informal. E, infelizmente, o que mais tem crescido nos últimos anos como atrativo para esses jovens é a informalidade ilícita, o crime organizado, que ensina o adolescente a abrir à bala um caminho sem futuro.
Os indicadores são graves e explodiram nos últimos cinco anos: o Brasil já é um dos campeões mundiais de mortalidade juvenil por violência. Cabe à sociedade reagir. Precisamos tirar o adolescente da escola do crime e abrir-lhe as portas da escola do trabalho.


Temos o maior número de adolescentes em nossa história e um mercado de trabalho encolhido; o resultado é desastroso


O instrumento legal já existe. O aprendizado previsto na Constituição de 1988 só foi regulamentado em dezembro de 2001, 13 anos depois. É a lei 10.097, que muito poucos conhecem e pela qual muitos jovens brasileiros serão beneficiados.
Essa lei inovadora permite que o adolescente, a partir dos 14 anos, possa, devidamente acompanhado por uma entidade assistencial certificadora de cursos profissionalizantes, trabalhar pelo período máximo de dois anos como aprendiz de um Programa de Convivência e Aprendizado no Trabalho.
Pela lei 10.097, o adolescente terá jornada máxima de seis horas diárias (duas de aula teórica e quatro de aula prática), familiarizando-se com a rotina do trabalho dentro de uma empresa. Ele aprende teoria na entidade educacional e recebe remuneração compatível com a sua condição de aprendiz, devidamente registrada em carteira, com o recolhimento dos encargos previdenciários. O período do aprendizado conta no seu tempo de serviço.
O desafio é a mobilização dos empreendedores para essa grande missão social. Para isso a Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo e a Associação Comercial de São Paulo se aliaram à Rede Brasileira de Entidades Assistenciais Filantrópicas em torno do movimento Degrau, que visa integrar as redes do segundo e do terceiro setores em favor do Programa de Convivência e Aprendizado no Trabalho.
Os resultados já estão começando a surgir. Fizemos uma parceria com o Ministério do Trabalho, com o Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e com a Associação Brasileira de Recursos Humanos. Sem nenhum subsídio público, o Degrau espera introduzir 120 mil adolescentes no mercado de trabalho ainda este ano, apenas no Estado de São Paulo. É a forma prática de conciliar austeridade fiscal com ação social.
Os empresários socialmente conscientes e os que não querem ser advertidos pelos fiscais do Ministério do Trabalho encontrarão orientações sobre como implementar a lei 10.097 no site.
Cumprir a lei 10.097 não é obrigatório para as pequenas empresas e nem deveria ser. Mas todas as empresas do país têm o dever de orientar pelo menos um jovem e introduzi-lo no mundo do trabalho. Sozinho, o governo não pode resolver o problema. A sociedade pode.

Guilherme Afif Domingos, 59, é presidente da Indiana Seguros S.A. e presidente emérito da Confederação das Associações Comerciais do Brasil.


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