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MARCOS NOBRE
Paradoxos eleitorais
JÁ SE DISSE que Serra tem muito
azar como candidato à Presidência. Em 2002, foi o candidato da continuidade quando a maré
era de mudança. Agora, é o candidato de oposição quando a maré é
de continuidade.
É verdade que, em 2002, o truque de ser "oposição dentro da
continuidade" não colou. Mas, em
2010, o truque de ser "continuidade dentro da oposição" está colando. E muito bem.
Serra virou lulista de carteirinha.
Promete mais do mesmo, só que
com um figurino bem mais conservador da autoridade presidencial.
Defende a ideia de que os últimos
25 anos de redemocratização representam um contínuo e progressivo processo de aprendizagem coletiva. Dilui o que há de específico
do governo Lula. Como todo mundo colaborou, o jogo político estaria zerado. E a eleição deixa de ser
um plebiscito do governo.
Contra todas as expectativas, a
estratégia Serra até agora tem sido
bem-sucedida. Conseguiu reduzir
a eleição a uma comparação de biografias. E o problema não é só que a
campanha de Dilma aceitou esse
terreno de disputa limitado. É que
até para isso seria preciso se descolar de Lula. Como esse descolamento não está previsto por enquanto, surgem patetadas como a
comparação de Dilma com Nelson
Mandela feita pelo próprio Lula.
O paradoxo maior da eleição está
no apoio do presidente. Como estão as coisas hoje, a maior ameaça à
candidatura de Dilma é não conseguir se distinguir o suficiente de
Lula. Porque, no fundo, o que a figura de Lula podia fazer, já fez. Colocou a sua candidata além do patamar histórico de votação do PT. Ou
seja, fez dela uma candidata competitiva. Esperar que Dilma seja
eleita apenas com base no apoio de
Lula simplesmente não é realista.
Não bastasse isso, também no
campo da articulação de alianças
Serra está na frente há já algum
tempo. Desde cedo, soube manejar
muito melhor os arranjos estaduais. A tal ponto que até Aécio
Neves parece estar reconsiderando
seriamente a ideia de ser candidato
a vice.
Já o apoio à candidatura Dilma
está gravemente ameaçado. Nem
mesmo uma aliança efetiva com o
PMDB pode ser hoje dada como
certa. O caso de Minas Gerais é paradigmático. O PT mineiro não
quer ir para o sacrifício quando
inúmeras seções estaduais do partido já resolveram ir contra a aliança nacional. E o próprio PMDB mineiro já não acredita em uma aliança para valer com o PT.
A única saída para Dilma é mostrar sua cara, é arriscar. O que talvez salve a eleição, já que, hoje, arriscar significa politizar a campanha. Ao contrário do que seria de se
esperar, a inércia está do lado de
Serra.
nobre.a2@uol.com.br
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras
nesta coluna.
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