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OTAVIO FRIAS FILHO
Fantasma
do centrão
Ao contrário das duas eleições
presidenciais anteriores, decididas em primeiro turno, a campanha
deste ano tem sido marcada por surpresas. Primeiro foi a irrupção da candidatura de Roseana Sarney, seguida
de sua derrocada. O crescimento de
Serra chegou a sugerir um desenlace
mais previsível -entre Lula e o candidato do governo.
Mas logo apareceu nova surpresa,
com o isolamento de Ciro Gomes na
segunda posição das pesquisas. Ao cenário sombrio, pelo lado da economia, corresponde esse ambiente político-eleitoral neurastênico, numa
campanha até aqui notável pelo frequente sobe-e-desce. A pré-campanha começou cedo demais, e o eleitorado ainda está alheio ao assunto.
Uma nova pergunta ocupa, agora, as
atenções do mercado político: a posição de Ciro vai se cristalizar ou ela é
mais um surto passageiro numa eleição até aqui cheia deles? Vai demorar
ao menos algumas semanas para que
isso comece a ficar claro. Já está em
curso, enquanto isso, uma contra-ofensiva das forças do governo para
pôr ordem na casa.
Víamos na postulação de Ciro uma
aventura alternativa, respaldada por
pequena fração tucana e pelo que restou da esquerda não-petista. Isso mudou. Seu "arco de alianças" já compreende metade do PFL, o grupo de
Tasso Jereissati e um amontoado de
dissidências regionais. O empresariado começa a nutrir simpático interesse pelo candidato.
Ao mesmo tempo em que ganha volume, sua candidatura perde nitidez.
Tal efeito depende menos de sua disposição pessoal, de feitio combativo,
do que dos dois mecanismos que vêm
mantendo o centro de gravidade da
política brasileira no centro-direita
desde a redemocratização, já faz 17
anos. O predomínio tucano é resultado deles.
O primeiro foi a introdução do segundo turno pela Constituição de 88.
A pretexto de ampliar a legitimidade
do eleito, seu propósito era alijar do
poder real certas "anormalidades" nas
duas franjas do sistema político: o PT
de um lado e o populismo de direita, à
la Maluf, de outro. Vence as eleições
um "centrão" amorfo, pesado de adesões.
O outro mecanismo é a autocomplacência do sistema político, livre de
normas capazes de compelir à formação de identidades partidárias e maiorias estáveis. O Congresso se torna
balcão de negócios a cada votação importante para o governo, o qual aceita,
aliás de bom grado, esse sistema de
apoios capilares que não o faz refém
de nenhum partido.
Quem inaugurou o estilo, ao menos
na época atual, foi Tancredo Neves,
em 85, com sua coligação que ia da direita à esquerda. Desde então não
houve presidente que não procurasse
manter o seu "centrão", sempre indócil em momentos de impopularidade,
mas manejável no restante do tempo.
Fernando Henrique foi exímio praticante dessa arte.
Luís Nassif fez ontem uma outra leitura dos defeitos de Serra como sendo
suas qualidades. Argumentou que
uma das dificuldades do candidato tucano é a convicção, por parte do sistema político, de que ele é refratário à
formação de bloco tão amplo e diluído, apto a desfigurar seu governo. Veremos agora se isso vale para Ciro.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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