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ALCINO LEITE NETO
O fim, o recomeço
Depois que esvaziarem ou fecharem a bolsa de Pandora da política brasileira, o PT será apenas uma sigla política como as outras, vagamente reformista, nominalmente à esquerda. As glórias da formação do
partido ficarão para os livros de história e os narradores nostálgicos. Os
mesmos livros descreverão o desfecho
patético do sonho petista e ilustrarão
as páginas com o principal trunfo do
PT: Lula, o primeiro operário a ocupar
a Presidência do Brasil.
Para os romances, ficará a descrição
do sentimento de derrota e do choque
moral de toda uma geração de militantes e intelectuais de esquerda, que
ao longo de 25 anos acreditou que o
PT transformaria a vida brasileira.
Não foi o que ocorreu. Uma época
terminou na história do país, a do PT
afirmativo e destemido, que lutava
contra o fisiologismo na política, se
mantinha à margem da corrupção endêmica e reunia as esperanças das esquerdas.
Como exercício de governo, a presidência de Lula já está virtualmente encerrada. O ano e meio que lhe resta será gasto na tentativa da reeleição e na
gestão de uma crise sem precedentes,
em que toda a política institucional
brasileira vai sendo colocada em xeque -e aí está um serviço público
prestado pelo PT em desgraça.
No salve-se quem puder, críticos petistas tentam distinguir a "banda podre" do partido de seus militantes autênticos, associados aos movimentos
sociais. Saem a campo para recordar
os princípios do PT e imaginam neutralizar a "direita" do partido, retomando o rumo à esquerda.
No entanto, o chamado campo majoritário do PT foi mais rápido e já se
reorganizou para não entregar o poder. Entre os militantes, a perplexidade tomou o lugar da ação, como antes
a condescendência com o governo havia prevalecido sobre a crítica.
Ou será que os petistas, cegos pela
esperança e pelo poder, não viram para onde tudo isso caminhava? Não terão visto como a burocracia partidária
esvaziava paulatinamente a expressão
das forças sociais embutidas no PT?
Como o fisiologismo se instalava no
coração da legenda? Como proliferavam alianças oportunísticas, alheias
aos compromissos históricos do partido?
Não houve um passo do governo de
Lula manifestamente contrário aos
ideais do PT que não recebesse um
aval indulgente da inteligência petista
-mesmo quando ele estabeleceu relações perigosas com outros partidos,
mesmo quando ele se tornou fiel seguidor da política econômica do governo precedente.
Para esta inteligência, era como se
tudo devesse ser justificado, como se
as ações do governo fossem parte de
um momento de transição pelo purgatório neoliberal, antes de o Brasil ascender ao novo socialismo democrático. Em vez disso, o que estava ocorrendo era o ajuste gregário do partido
ao velho establishment político.
"O desespero tem a expressão do irrevogável, não porque as coisas não
possam de novo tornar-se melhores,
mas porque arrasta para seu abismo o
próprio passado. Eis por que é tolo e
sentimental querer conservar puro o
passado diante da torrente de imundícies do presente. Ao passado não resta
outra esperança a não ser entregar-se
sem defesas à desgraça, para dela ressurgir como algo diferente", escreveu
um filósofo alemão.
O epílogo melancólico do sonho petista é o princípio de uma nova era das
esquerdas no Brasil.
Alcino Leite Neto é editor de Domingo. Hoje, excepcionalmente, não é publicado o artigo de João Sayad, que escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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