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RUY CASTRO
A utopia da melancia quadrada
RIO DE JANEIRO - Um dia, ao
guardar uma melancia na geladeira,
certo agricultor japonês da ilha de
Shikoku observou que ela tomava
mais espaço do que precisava. Com
sua forma arredondada, deixava
cantos vagos que não podiam ser
ocupados com nada. Além disso, a
falta de estabilidade a tornava difícil de cortar. Um caso clássico de erro de design por parte da natureza.
O homem resolveu agir. Passou a
cultivar melancias dentro de caixas
de vidro -ao crescer, elas teriam de
adotar o formato da caixa. Vinte
anos e muitas gerações de melancias depois, em 2001, ele colheu as
primeiras melancias quadradas. Isso é um fato. As agências internacionais até deram as fotos.
Não que as melancias quadradas
fossem perfeitas. Entre outras coisas, em alguma fase do processo,
perdiam a doçura e ficavam neutras
como pepinos. E quem precisa de
pepinos quadrados?
Ao ler aquilo, pensei que, quando
um país se dá ao luxo de cultivar
melancias quadradas, é porque chegou ao ápice e já resolveu todos os
outros problemas. Mas o Japão
também tem seus problemas.
Depois me convenci de que, ao
contrário, quanto mais um país tem
problemas, mais deveria cultivar
melancias quadradas. Enquanto
seus economistas queimam pestanas para fazer o país andar, é preciso que um sonhador se debruce sobre a utopia da melancia quadrada.
O perigo é quando os economistas resolvem eles próprios partir
para a melancia quadrada. Esta semana, enquanto as Bolsas desabavam pelo mundo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, dizia, feliz
como água de chafariz, que o Brasil
estava numa boa, cheio da grana, e
nada nos atingiria. No fundo, estava
apenas produzindo uma melancia
quadrada.
Agora que os fatos o desmentiram, ele precisa explicar o tamanho
do pepino.
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