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São Paulo, sábado, 18 de outubro de 2003

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CLÓVIS ROSSI

O sonho do caixeiro-viajante

BUENOS AIRES- Luiz Inácio Lula da Silva põe sob o braço um sonho, o da integração sul-americana, e sai por aí vendendo-o. Não há discurso, nas muitas viagens do presidente ao exterior, em que ele deixe de falar do sonho. E com tão crescente paixão, que, no Congresso argentino, anteontem, chegou a enxergar "o embrião de uma nação sul-americana".
Não é uma mudança desprezível em um país que viveu a maior parte de sua história de costas para os vizinhos, olhando primeiro para a Europa e, mais recentemente, para os Estados Unidos.
O sonho da integração era sonhado em espanhol, por ícones como José de San Martín e Simon Bolívar, não em português.
É verdade que os rudimentos do projeto sul-americano começaram no governo Itamar Franco (não por acaso o chanceler era o mesmo de agora, Celso Amorim). É também verdade que ganharam algum impulso na gestão Fernando Henrique.
Mas foi com Lula que a idéia tomou velocidade. Mais que isso: o governo assumiu a tese, inexorável, de que liderar o projeto sul-americano implica arcar com custos, até porque no mundo moderno não há almoço gratuito (talvez no mundo antigo também não houvesse, mas fingia-se que, pelo menos, sonhar era de graça).
Integração sem pontes, aeroportos, telecomunicações, energia não é integração, costuma dizer Lula nessa sua vida de caixeiro-viajante do sonho integracionista.
O problema é que, como lembrou na quinta-feira seu colega argentino Néstor Kirchner, "a integração tem que ter sustentabilidade interna". Ou seja, economias capengas como são (ou estão) a da Argentina e a do Brasil não são exatamente alicerces sólidos para a integração.
A menos que os dois presidentes resolvam fazer da construção externa um elemento auxiliar da reconstrução interna.
Fácil não é. Mas tantos sonhos foram sonhados neste canto do mundo que, de repente, um deles cola.


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