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São Paulo, domingo, 19 de janeiro de 2003

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ESTADO DA PREVIDÊNCIA

Entre as atribuições de um Estado de Bem-Estar Social estão a necessidade de prestar condignamente os seus serviços universais típicos -como saúde, educação e acesso à Justiça- e o dever de garantir, idealmente à totalidade dos trabalhadores, uma renda vitalícia durante a aposentadoria. O Brasil, que aspira a tornar-se uma sociedade mais justa, ainda está longe das duas conquistas. Reformar a Previdência brasileira é uma maneira de abrir uma perspectiva concreta para a melhoria do serviço público compatível com a desejada universalização do sistema de contribuições e pensões.
Emaranhados nas forças que convergem para a reforma certamente estão interesses que enxergam o Estado e o serviço público como um estorvo a ser minimizado. Quando os servidores manifestam o temor de que a mudança na Previdência redunde num sucateamento ainda maior dos serviços públicos, portanto, merecem atenção.
Uma das formas de liberar capacidade financeira do Estado para que ele melhore sua prestação de serviços é acabar com o regime de aposentadorias integrais dos servidores, respeitando o direito adquirido em sua proporcionalidade.
Trabalhadores públicos argumentam que são mais onerados em seu regime previdenciário, pois desembolsam todo mês 11% do total de seus salários como contribuição previdenciária. O trabalhador da iniciativa privada contribui, no máximo, sobre R$ 1.560, independentemente de receber vencimento maior. Mas o montante de contribuições dos servidores está longe de cobrir os dispêndios com as aposentadorias integrais dos inativos. Neste ano, estima-se que os servidores federais da ativa contribuirão com quase R$ 6 bilhões para sua previdência. O dispêndio do governo com inativos deverá aproximar-se de R$ 34 bilhões. Essa diferença será coberta com dinheiro proveniente dos impostos federais e/ou com mais endividamento público.
Modificar esse sistema injusto, rumando a um regime mais equânime, é um dos passos necessários para recuperar a capacidade de gasto e investimento público em médio prazo. Esse é o aspecto a ressaltar na negociação que o governo fará com o funcionalismo público em direção à reforma previdenciária. Se os servidores perdem de um lado, pois a expectativa de uma aposentadoria integral será frustrada, podem e devem ganhar de outro, na melhoria progressiva de suas condições de trabalho.
Pressões das chamadas carreiras típicas de Estado (diplomatas, militares, juízes etc.) pela manutenção de um tratamento especial na aposentadoria poderiam ser transformadas, nessa negociação, em discussões propriamente trabalhistas, acerca de planos de melhoria paulatina de remuneração e benefícios.
Do modo como o sistema funciona hoje, projetos de expansão e de melhoria do serviço público são prejudicados pela necessidade de arcar com os volumosos déficits previdenciários. Se o mecanismo da aposentadoria integral permanecer, os governos serão levados a fazer o ajuste, como aliás já o vêm fazendo, pelo aviltamento do salário do servidor da ativa e das suas condições de trabalho, com prejuízo para a população usuária dos serviços do Estado.
Não se deseja, de maneira nenhuma, uma reforma previdenciária feita a partir da "demonização" do funcionário público. Essa categoria precisa perder a prerrogativa da aposentadoria integral, entre outras razões, para que o Estado possa prestar melhores serviços. Para que possa começar a abrir à grande maioria de seus funcionários e usuários o horizonte que não existe hoje.



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