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TENDÊNCIAS/DEBATES
Deve-se restringir a independência das agências reguladoras?
NÃO
Voltar ao modelo estatista e fisiológico?
ALBERTO GOLDMAN
Injustos são aqueles que pensam
que os dirigentes do governo Lula
não têm vontade ou capacidade para
produzir mudanças. É verdade que,
tanto na política econômica, na qual só
aprofundaram a tão repudiada ortodoxia, quanto nas políticas sociais, em que
tentam, sem sucesso, inventar políticas
de inclusão sob novas denominações,
não têm obtido maiores resultados. Mas
estão à procura de deixar a sua marca
para justificar a que vieram. E os bodes
expiatórios são as agências reguladoras.
As agências foram criadas por lei, uma
a uma, após exaustivas discussões no
Congresso Nacional, das quais participaram amplamente os diversos segmentos da sociedade. Foram concebidas, é verdade, com variações de uma
para outra, à medida que a discussão ia
se aprofundando e a experiência legislativa ia se aperfeiçoando, como agentes
do Estado, não como uma repartição
governamental. A sua característica
principal, dessa forma, passou a ser a
sua independência administrativa e financeira, dentro dos limites constitucionais possíveis, e a sua autonomia decisória para implementar as políticas do
Executivo e do Legislativo, essas sim
competência do presidente e dos parlamentares eleitos. Subordinação somente às leis e aos tribunais.
A criação das agências não foi um ato
isolado, mas fez parte da nova concepção do Estado brasileiro. Vale dizer, da
redefinição do papel dos entes estatais,
do seu gerenciamento, de suas responsabilidades e de sua relação com o setor
privado da economia. E o resultado desse novo modelo é altamente positivo,
ainda que revisões possam e devam ser
feitas. Os avanços nos setores de telecomunicações e petrolífero são exemplos
claros de sucesso -e os insucessos no
setor elétrico se deram menos em função da agência e mais em função das indefinições políticas do governo.
Com a criação das agências e a definição de novas responsabilidades para o
setor privado, dezenas de empresas estatais deixaram de ter o preenchimento
de seus cargos de direção determinados
pelo tradicional fisiologismo da política
nacional. Eis aí algo que os novos "companheiros" no poder não engolem. Afinal, a "companheira" Dilma Roussef
comanda o "companheiro" José Eduardo Dutra, presidente da Petrobras, e o
"companheiro" Jorge Miguel Samek,
presidente de Itaipu, mas não comanda
a Agência Nacional de Petróleo nem a
Agência Nacional de Energia Elétrica; e
o Senado se deu ao desplante de exercer
seu poder recusando uma indicação política para aquela.
No setor de telecomunicações, as empresas são privadas e a agência é autônoma, só sobrando ao ministro Miro
Teixeira a indicação dos "companheiros" dos Correios. Infelizmente não se
deram conta -à exceção da ministra
Dilma- de que o papel mais nobre e
importante que têm, e que a lei lhes determina, é o de construir as políticas de
cada setor, cabendo às agências implementá-las.
Agora o governo trabalha na reformulação do papel das agências, através de
um projeto de lei a ser encaminhado ao
Congresso. Menos mal do que vem fazendo, que é a desqualificação e a sabotagem delas. Se o objetivo for caracterizar melhor o que significa "definição de
políticas", tudo bem, será um aperfeiçoamento da legislação. No entanto, a
valerem as informações, que vazam
-ou são vazadas-, de que perderão
sua independência e sua autonomia, de
que terão de obedecer a um "contrato
de gestão" com cumprimento de metas
(que metas seriam, se elas, agências, não
são agentes da produção, não operam
empresas?), de que não serão responsáveis pelos contratos de concessão dos
serviços públicos e de que os mandatos
de seus dirigentes serão coincidentes
com os do presidente da República (os
mandatos não são coincidentes justamente para que haja continuidade na
gestão da agência), de que vale a sua
existência? Mais honesto seria propor
sua extinção e voltar ao modelo nacional/estatista/fisiológico do passado.
O que se fez nos últimos anos foi criar
instrumentos menos sensíveis a interesses políticos conjunturais, uma regulação que não sofresse de falta de continuidade com a mudança de governos,
visto que se trata da relação do poder
concedente com concessionários, privados ou estatais, que deve ter estabilidade em face dos longos prazos que caracterizam as concessões de serviços
públicos. Vale dizer, objetiva-se dar segurança a investimentos que, inevitavelmente, são de retorno a médio e longo prazo, dentro de condições estipuladas que devem atender tanto às empresas, quanto aos usuários. Afinal, são investimentos que viabilizam a produção,
o atendimento às necessidades dos serviços públicos, o crescimento econômico e a geração de empregos. Sem eles, o
"espetáculo do crescimento" vai virar
um deprimente espetáculo de recessão.
Alberto Goldman, 65, deputado federal pelo PSDB-SP, é vice-presidente da Executiva Nacional do partido. Foi ministro dos Transportes (governo Itamar Franco) e secretário da Administração do Estado de São Paulo (governo Quércia).
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